Translate this Page




ONLINE
2





Partilhe esta Página

                                            

            

 

 


Barroco
Barroco

 

O Barroco foi desenvolvido no século XVII.  Nesse período, o terror provocado pela inquisição tentava limitar pensamentos e manifestações culturais e impor a austeridade.

 

Uma época de crises religiosas

Em resposta à Reforma protestante, o Concílio de Trento (1545-1563) instaurou uma grande reformulação no catolicismo.  A disciplina e a autoridade da Igreja de Roma foram reafirmadas vigorosamente.  Era o movimento da Contrarreforma.

 

Nos estados protestantes, onde havia condições favoráveis à liberdade de pensamento, a investigação científica iniciada no Renascimento pôde prosseguir.  Já nos estados católicos, desenvolveu-se um movimento chamado Contrarreforma, que reprimiu as manifestações culturais ou artísticas que pudessem contrariar as determinações da Igreja.

 

A Inquisição, que se estabelecera na Espanha a partir de 1480 e em Portugal a partir de 1536, ameaçava cada vez mais a liberdade de pensamento. O clima geral era de austeridade e repressão.  É nesse contexto que se desenvolve o movimento artístico chamado Barroco, que se estende do século XVII até meados do século XVIII, aproximadamente.

 

O poeta entre o céu e o inferno

                        Buscando a Cristo

            A vós correndo vou, braços sagrados,

            Nessa cruz sacrossanta descobertos,

            Que, para receber-me, estais abertos,

            E, por não castigar-me, estais cravados.

 

            A vós, divinos olhos, eclipsados

            De tanto sangue e lágrimas cobertos,

            Pois, para perdoar-me, estais despertos,

            E, por não condenar-me, estais fechados.

 

            A vós, pregados pés, por não deixar-me,

            A vós, sangue vertido, para ungir-me,

            A vós, cabeça baixa, pra chamar-me.

           

            A vós, lado patente, quero unir-me,

            A vós, cravos preciosos, quero atar-me,

            Para ficar unido, atado e firme

 

                                        MATOS, Gregório de, In Poesia barroca

                                                          São Paulo: Melhoramentos.

 

Na artebarroca, a imagem do Cristo sofredor é muito mais frequente do que a imagem do Cristo vitorioso.  Representa-se mais a dimensão humana de Cristo, as marcas de seu sofrimento como homem, do que sua vitória sobre a morte, como Filho de Deus.  Essa imagem do sofrimento físico causa um impacto muito forte e envolve emocionalmente as pessoas, e esse é um dos objetivos principais do artista barroco.

 

No soneto de Gregório de Matos, vemos que o eu lírico volta seu olhar exatamente para o corpo crucificado de Cristo, descrevendo suas feridas e as marcas de seu martírio.  Mas é esse sofrimento físico a garantia da salvação da alma que o busca, pois segundo a fé católica na época, o sangue de Cristo foi derramado para salvar o homem pecador.

 

O sangue que salva

Observe que o eu lírico, à medida que descreveu o corpo de Cristo, revela o valor espiritual e resgatador do sofrimento físico.  Os braços estão abertos para amparar e abrigar o pecador, mas estão cravados e imóveis para não castigar.  Os olhos, meio encobertos de sangue e lágrimas, estão abertos para perdoar, mas fechados para não ver os pecados.  Os pés pregados reforçam a ideia de sofrimento ao mesmo tempo que sugerem que Cristo não sairá de perto do pecador.  O sangue vertido adquire o valor simbólico do sacrifício que resgatará a humanidade.  Por último a cabeça baixa , que revela o fim das forças físicas, é vista como uma atitude de amor, pois Cristo abaixa os olhos para chamar a si o pecador.  No último terceto, o desejo de união espiritual com Cristo é representado pelo desejo de união física: o eu lírico quer prender-se ao corpo sagrado, quer ficar cravado na cruz com Ele.

 

Como você percebeu, há no texto grande dramaticidade, pois o eu lírico expressa a consciência do pecado e o desejo da salvação.  Essa oscilação que leva o homem de um extremo a outro, que revela sua dimensão carnal e espiritual é uma das características marcantes da literatura barroca.

 

A palavra barroco

O verdadeiro significado da palavra barroco ainda não foi totalmente esclarecido.  Parece ter surgido na ourivesaria para designar um certo tipo de pérola irregular.  Mas é preciso destacar que a denominação barroca não existia na época em que o barroco se desenvolveu.  Nenhum artista desse período se autodenominava barroco.  Essa expressão surgiu bem mais tarde e tinha inicialmente uma conotação pejorativa, designando algo imperfeito, extravagante, que não seguia a ordem e o equilíbrio dos padrões da arte clássica.

 

No final do século XIX, a palavra barroco foi perdendo o caráter negativo e firmou-se como a denominação desse estilo artístico do século XVII, abrangendo não só a arquitetura, escultura e pintura, como também a música, a literatura e as artes decorativas.

 

A intensidade dramática do Barroco

O tema central do Barroco se encontra na antítese entre vida e morte.  Daí decorre o sentimento da brevidade da vida, da angústia da passagem do tempo, que tudo destrói.  Diante disso, o homem b arrocho oscila entre a renúncia e o gozo dos prazeres da vida.  Quando pensa no julgamento de Deus, foge dos prazeres e procura apoio na fé.  Quando a fé é insuficiente, a atração dos prazeres o envolve e cresce o desejo de desfrutar a vida.

 

Por isso, o carpe diem, expressão latina que significa “aproveita o dia (presente)”, é um dos temas frequentes da arte barroca.  A mocidade ou a juventude é frequentemente comparada à flor, que é bonita por pouco tempo e logo morre.  Daí, o apelo dos poetas barrocos, como este do poeta brasileiro Gregório de Matos:

 

                        “Goza, goza da flor da mocidade,

                        Que o tempo trata a toda ligeireza

                        E imprime em toda flor sua pisada.

 

                        Ó não aguardes, que a madura idade

                        Te converta essa flor, essa beleza,

                        Em terra em cinza, em pó, em sombra, em nada”.

 

O carpe diem é um tema que vinha já da Antiguidade, mas no Barroco foi desenvolvido de forma angustiada, pois era uma tentativa de fundir os opostos, de conciliar o que, no fundo, é inconciliável: a razão e a fé, a matéria e o espirito, a vida carnal e a vida espiritual.

 

A linguagem barroca

 

Para falar das contradições do mundo exterior e do mundo interior, o escritor barroco usa e abusa do jogo de palavras, das antíteses, das hipérboles, das frases tortuosas, dos paradoxos.  Utiliza palavras raras, inspira-se no latim para criar novos termos, explora a riqueza das imagens.

 

Essa linguagem preciosa e rebuscada do Barroco, que abusa das metáforas, das antíteses e dos paradoxos, recebe o nome de cultismo.  Um dos grandes poetas cultistas foi o espanhol Luís de Gôngora; por isso, o cultismo é também conhecido por gongorismo.

 

Quando o rebuscamento se dá na expressão do raciocínio, com a exploração do jogo de ideias e sutilezas de argumentação, recebe o nome de conceptismo (do espanhol concepto, conceito, ideia).

 

Estes versos de Gregório de Matos, que falam sobre os efeitos do amor, exemplificam o gosto do Barroco pelo jogo dos contrários:

 

                        “Ardor em coração firme nascido!

                        Pranto por belos olhos derramado!

                        Incêndio em mares de água disfarçado!

                        Rio de neve em fogo convertido!”

 

O BARROCO EM PORTUGAL

Em termos didáticos, o Barroco português vai de 1580 a 1756.

 

O ano de 1580 é significativo em dois aspectos: assinala a morte de Camões, o maior nome do Classicismo português, e marca o fim da autonomia política de Portugal, pois, com a morte de D. Sebastião, em 1578, o rei Felipe II, da Espanha, ganha o direito de subir ao trono português.  Portugal passa a fazer parte do reino espanhol.  Com a transferência do centro politico para Madri, Portugal perde também seu foco cultural.  Em todo o século XVII, a influência espanhola será marcante na cultura portuguesa.

 

Em 1640, Portugal consegue libertar-se do domínio espanhol, e D. João IV, da dinastia de Bragança, é coroado rei.  Porém, até 1668 o reino português ainda teria de sustentar muitas lutas, não só contra os espanhóis, para defender seu território, como também contra os holandeses, para recuperar as colônias da África ocidental e parte do Brasil.

 

A fundação da Arcádia Lusitana, em 1756, marca simbolicamente o fim do Barroco e o início do Arcadismo.  Nessa altura, Portugal já vivia as transformações sociais e culturais provocadas pela ação vigorosa do marquês de Pombal, ministro do rei D. José I, que subiu ao poder em 1750.

 

O padre Antônio Vieira é o principal autor do Barroco em Portugal.  Como ele passou a maior parte de sua vida no Brasil, será mencionado mais adiante.  Além de Vieira, merecem lembrança o padre Manuel Bernardes, D. Francisco Manuel de Melo, Francisco Rodrigues Lobo, sóror Mariana Alcoforado e Antônio José da Silva.

 

O BARROCO NO BRASIL

Nos séculos XVII e XVIII, ainda não havia no Brasil condições para o desenvolvimento de uma atividade literária propriamente dita.  Nosso imenso território era, na maior parte, despovoado.  A vida social brasileira girava em torno de alguns pequenos núcleos urbanos e a vida cultural praticamente não existia.  As pessoas letradas que viviam nas mesmas cidades reuniam-se de vez em quando para conversar e mostrar uns aos outros, os textos que eventualmente tivessem escrito (poesias, artigos, ensaios, etc.).  Só no século XIX começou a formar-se um público leitor que possibilitou a continuidade da produção literária.

 

Em vista dessa precariedade cultural da sociedade brasileira, seria exagero falar em movimento barroco no Brasil. O que temos, na verdade, são alguns escritores que, bebendo em fontes estrangeiras (geralmente autores portugueses e espanhóis), produzem aqui textos com características barrocas. Desses escritores merecem destaque Gregório de Matos, por suas poesias, e o padre Antônio Vieira, por seus sermões.  Além deles, temos Bento Teixeira (1561?-1600), autor do poema Prosopopéia, de 1601, que costuma ser considerado o marco inicial do Barroco brasileiro, e Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711), autor do livro Música do Parnaso.

 

Gregório de Matos           

Gregório de matos (1636-1696) é o maior nome da poesia barroca brasileira.  Não teve nenhum livro publicado em vida.  Depois de sua morte, os manuscritos encontrados foram sendo publicados em diferentes coletâneas, sem nenhum rigor crítico.  O que chamamos de obra poética de Gregório de Matos e, na verdade, fruto de pesquisas nessas coletâneas, o que ainda deixa dúvidas sobre a autenticidade de muitos textos que lhe são atribuídos.

 

Suas poesias amorosas e religiosas, que revelam influência dos barrocos espanhóis, despertaram inicialmente a atenção da crítica, mas hoje sua produção satírica, escrita em linguagem debochada e plena de termos de baixo calão, também vem sendo valorizada por representar um documento do ponto de vista sociológico e linguístico.  Por suas críticas ferinas à sociedade baiana, Gregório de Matos recebeu o apelido de “Boca do Inferno”.

 

Ainda se fazem poesias religiosas?

Embora a época do Barroco tenha passado, a produção de poesias religiosas não parou.  Mesmo poetas contemporâneos tem escrito sobre os dilemas do ser humano quanto à existência ou não de Deus, quanto ao destino do homem depois da morte, etc.  Mudou o modo de ver a questão, mas o problema em si não foi resolvido e ainda angustia muitos poetas.

 

Padre Antônio Vieira

Antônio Vieira (1608-1697) escreveu muitos sermões, dentre os quais se destacam:  Sermão da sexagésima, em que discorre sobre a arte de pregar; Sermão de Santo Antônio aos peixes, em que trata da escravidão do indígena; Sermão do mandato, em que fala do amor místico de Cristo; Sermão pelo bom sucesso das armas de Portugal contra as da Holanda, que proferiu por ocasião do cerco dos holandeses à cidade da Bahia.

 

Deixou ainda uma grande quantidade de cartas, que são documentos importantes para o estudo da época em que viveu, e as obras História do futuro e Esperanças de Portugal, de cunho sebastianista, publicadas postumamente.