SEGUNDA FASE DO MODERNISMO: PROSA
Passada a fase mais combativa e contestatória do Modernismo, a produção literária brasileira começa a entrar num período de amadurecimento. É a segunda fase do Modernismo que se inicia.
UMA ÉPOCA DE GRANDES ROMANCISTAS
Os autores que participaram dos momentos iniciais do movimento continuam escrevendo, mas é a nova geração, surgida na década de 1930, que consolida a renovação literária. É a segunda fase do Modernismo, didaticamente situada entre 1930 e 1945. No campo da prosa, em que ocorre uma rica produção de romances, observamos três tendências principais:
ROMANCE INTIMISTA E PSICOLÓGICO
Em que predomina o interesse pela análise do mundo interior das personagens e seus conflitos íntimos. Autores principais: Lúcio Cardoso, Cornélio Pires e Ciro dos Anjos.
ROMANCE DE TEMÁTICA SOCIAL URBANA
Com predominância na análise dos conflitos que surgem entre as personagens e as estruturas sociais urbanas. Autores principais: Érico Veríssimo, Dionélio Machado, Marques Rebelo e Otávio de Faria.
ROMANCE SOCIAL NORDESTINO
Em que predomina a denúncia das injustiças sociais e dos problemas econômicos do Nordeste, o drama dos retirantes da seca e a vida sofrida da população pobre. Autores principais: Graciliano Ramos, José Lins do Rego, Rachel de Queiróz, Armando Fontes e Jorge Amado.
RAQUEL DE QUEIROZ
Raquel de Queiroz (1910-2002) destacou-se, ainda bastante jovem, com a publicação do romance O Quinze (1930), que aborda o drama dos retirantes nordestinos. Prosseguiu sua carreira com os romances João Miguel, Caminhos de pedra, As três Marias e Memorial de Maria Moura. Escreveu também peças de teatro e crônicas.
O QUINZE
O tema deste romance é a seca, enfocando a dimensão social, sem deixar de lado a análise psicológica de algumas personagens. A marca penosa e trágica de Chico Bento, que representa o retirante, constitui o núcleo dramático da obra. Paralelamente, desenvolve-se o drama da impossibilidade de comunicação afetiva entre Vicente e Conceição – ele, um proprietário rural sensível à miséria que o rodeia, mas impotente para eliminá-la; ela, uma moça da cidade, atraída pela figura livre e franca de Vicente, mas que não consegue penetrar em seu mundo rude, quase selvagem.
JORGE AMADO
Jorge Amado (1912-2001) é um dos mais conhecidos escritores brasileiros e o romancista da Bahia por excelência. Seus primeiros romances – Cacau (1933), Jubiabá (1935), Mar Morto (1936), Capitães de Areia (1937) e Terras do sem fim (1943) – constituem francas denúncias sociais e correspondem ao período de intensa participação política do autor, na época filiado ao Partido Comunista Brasileiro.
A partir de 1958, com o romance Gabriela, cravo e canela, Jorge Amado inicia uma nova fase, em que predominam a crítica de costumes e a sátira, características presentes nos romances que se seguiram, de grande aceitação popular, como Os pastores da noite; Dona Flor e seus dois maridos; Tenda dos Milagres; Teresa Batista Cansada de Guerra; Tieta do Agreste; Farda, fardão, camisola de dormir; Tocaia grande; O sumiço da santa. Escreveu também as novelas A morte e a morte de Quincas Berro d’água e Os velhos marinheiros.
TERRAS DO SEM FIM
Este romance trata da fixação e expansão das fazendas de cacau, em São Jorge dos Ilhéus, na Bahia. A cobiça e o desejo de enriquecimento levam dois fazendeiros ao confronto; ambos disputam as terras incultas de modo violento.
GRACILIANO RAMOS
Graciliano Ramos (1892-1953) é considerado o mais importante prosador da segunda fase do Modernismo. Sua obra compõe-se de romances: Caetés, São Bernardo, Angústia, Vidas Secas; contos: Insônia; memórias: Infância, Memórias do cárcere. Escreveu também um livro de literatura infantil: Histórias de Alexandre.
VIDAS SECAS
Composto de uma sucessão de cenas que focalizam diferentes momentos na vida de uma família de retirantes (Fabiano, sinhá Vitória, seus dois filhos e a cachorra Baleia), Vidas Secas surpreende pelo relato objetivo de pessoas simples, sem grandes ambições e exploradas por outros homens.
JOSÉ LINS DO REGO
Muitas das obras de José Lins do Rego (1901-1957) apresentam forte conteúdo memorialista, revelando reminiscências da infância e adolescência passadas no engenho do avô, na Paraíba. Os romances em que tratou da vida nos engenhos, da decadência das velhas estruturas econômicas do Nordeste e dos desmandos dos autoritários senhores do engenho costumam ser reunidos no que ele próprio chamou de “ciclo da cana-de-açúcar” e são os seguintes: Menino de engenho, Doidinho, Bangüê, Usina, Fogo morto. Escreveu ainda: Pedra bonita e Cangaceiros, que compõem o “ciclo do cangaço, misticismo e seca”; O moleque Ricardo, Pureza, Riacho doce, Água-mãe, Eurídice.
FOGO MORTO
O romance Fogo morto é considerado a obra-prima de José Lins do Rego. Faz parte do “ciclo da cana-de-açúcar” e é dividido em três partes:
A primeira parte – “O mestre José Amaro” – enfoca principalmente a figura de um velho seleiro frustrado, que mora com a mulher e a filha nas terras do Engenho Santa Fé, cujo dono, Lula de Holanda, quer que ele vá embora. Às brigas com o senhor do engenho somam-se as desilusões com a própria arte e com a vida familiar.
O “engenho de seu Lula” é o título da segunda parte e trata, sobretudo, da história do Engenho Santa Fé, que prosperou com seu primeiro dono, o capitão Tomás Cabral de Melo, mas que foi se acabando nas mãos do genro, Luis César de Holanda Chacon, o seu Lula, casado com Amélia.
A terceira parte tem por título “O capitão Vitorino”, compadre do mestre José Amaro e também uma espécie de herói quixotesco, que vivia lutando e brigando por justiça e igualdade, sempre em defesa dos humildes contra os poderosos da terra, sendo por isso ridicularizado. É, no entanto, o único que permanece firme até o fim, pois o mestre José Amaro, não suportando as frustrações e a solidão (a filha enlouquecera e fora internada e a mulher o abandonara), acaba por suicidar-se, e o coronel Lula, atacado por doenças, está praticamente morto.
Destaca-se, nesse romance, a habilidade do autor em estruturar as sequências narrativas, entrelaçando as ações das personagens em todas as partes e fixando a decadência econômica do Engenho Santa Fé juntamente com a decadência da própria vida das famílias que lá moravam. Do amplo quadro das personagens, sobressaem ainda o cangaceiro Antônio Silvino, o cego Torquato, o negro Passarinho e o coronel José Paulino.
ÉRICO VERÍSSIMO
Os romances do gaúcho Érico Veríssimo (1905-1975) podem ser divididos em duas fases principais. A primeira reúne as obras que transcorrem num ambiente urbano e contemporâneo, em que personagens vivem problemas existenciais numa sociedade em crise. Dessa fase, destacam-se: Clarissa (1933), Música ao longe (1935), Um lugar ao sol (1936), Olhai os lírios do campo (1938), Saga (1940), O resto é silêncio (1943).
Na segunda fase, o autor deixa de lado o presente e mergulha numa ampla obra cíclica, denominada O tempo e o vento, cujo objetivo é reconstituir as origens e os episódios da formação social do Rio Grande do Sul. É composta dos romances O continente (1949), O retrato (1951) e o arquipélago (1961).
Nos últimos livros, o autor inicia uma nova temática em sua ficção, voltando-se para assuntos políticos, como em O prisioneiro (1967), O senhor embaixador (1965), Incidente em Antares (1971). Em 1973, publica sua última obra, Solo de clarineta, em que narra suas memórias.
INCIDENTE EM ANTARES
A hipocrisia social, a análise de problemas humanos e políticos, a violência e o autoritarismo fazem parte de Incidente em Antares, uma das últimas obras de Érico Veríssimo.
O incidente a que se refere o título é um estranho fato que acontece numa sexta-feira 13: por causa de uma greve de funcionários, sete mortos deixam de ser enterrados no cemitério de Antares, uma cidade onde vivem famílias tradicionais e inimigas, preocupadas com suas tradições e escondendo, atrás das aparências, uma realidade que não desejam revelar.
Enquanto o prefeito negocia com os grevistas, os cadáveres saem dos caixões e vão reclamar o seu direito de descansar em paz. Eles estão mortos, são cadáveres, mas podem falar, denunciar e incomodar os vivos com suas confissões. Delírio? Ilusão? Como terminará esse pesadelo para os moradores de Antares, que veem suas vidas devassadas por esses mortos?