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Filosofia Mínima: Estimulante p/Professores/Alunos
Filosofia Mínima: Estimulante p/Professores/Alunos

ESTIMULANTE PARA PROFESSORES E ALUNOS

 

Análise | Filosofia Mínima

Escritor e crítico exalta qualidades do livro do professor Fischer, lançado em 2011

 

Uma das maiores satisfações, que pode experimentar um leitor que continua a sentir o prazer do texto à maneira de Roland Barthes, é encontrar um livro não só interessante, bem escrito, mas repleto de autenticidade, paixão e... humor. Refiro-me ao livro do professor Luís Augusto Fischer que a editora Arquipélago Editorial publicou quase na década passada, tal a desmemoria que nos atinge, a todos. Topei com este livro numa calçada do Bonfim, onde um vendedor ambulante tem sua banca. Considero-me um privilegiado “por ter sido encontrado pelo livro de Fischer”, w não, a rigor, por eu o ter encontrado.

 

O livro do professor oferece um subtítulo: LER, ESCREVER, ENSINAR, APRENDER. O espantoso é que o livro trata exatamente disso! Perdoem-me, leitores exigentes, meu aparente sentido de humor! Boa parte dos livros editados no Brasil sugerem uma coisa e tratam de outra. Principalmente num período histórico como o nosso, quando tudo parece ter virado ideologia, ou mero palpite pessoal. Fisher decidiu escrever um livro sobre determinado tema e cumpriu sua promessa.

 

Não sou dado a números, mas desta vez recorri à minha calculadora eletrônica. O autor dedicou 150 páginas ao tópico LER; 57 páginas ao tópico ESCREVER; 51 páginas ao tópico ENSINAR; 53 páginas ao tópico APRENDER. À sua autoapresentação dedicou 61 páginas.

 

Não há dúvida de que o professor Fischer é competente, principalmente quando não fala de si, quando se limita a falar do que objetivamente domina, a teoria e a história da literatura. Ao discorrer sobre esses assuntos, tirem-lhe o chapéu, ou o que tiverem na cabeça. A avaliação de Flávio Loureiro Chaves sobre FILOSOFIA MÍNIMA é precisa:  “É mais que uma reunião de escritos: é um programa de ação – ler, escrever, ensinar, aprender.”

 

Senhores professores, é preciso ler a prata da casa. O livro de Fischer é um livro humanista – no melhor sentido da expressão. O estilo de Fischer é desenvolto, quase um estilo à Machado de Assis, o clássico do melhor português já escrito no Brasil, desde que o grande escritor seja imaginado de tênis, um tanto hippie, amigo da cerveja, e sensível aos truques da mídia. Porque Fischer distingue-se de seus melhores colegas por exibir um humor que não poupa nem a si mesmo. Um humor que, por vezes, chega à imprudência de denunciar uma tal ou qual ocasional grossura, a de gauchões machistas, soi-disant invulneráveis a toda autocrítica. Leiam o texto dele intitulado “Nicanor e o corte epistemológico” (p.83-90), no qual o professor e ensaísta (também ficcionista) se excede como humorista. O palito do seu  Beijinho – que não era senão “um espinho de laranjeira, daqueles grandes” é algo que evoca Tchekhov! Um Tchekhov que tivesse bebido chimarrão desde piá e sentisse leve prazer demoníaco de denunciar nossos... Bem, aqui estou me desviando do tema que me propus.

 

Fischer, nesta sua FILOSOFIA MÍNIMA, produziu uma apologia da arte de ensinar. A primeira parte do livro não só é um elogio ao professor – a qualquer professor que, alguma vez, tenha sido sério e levado a sério sua profissão. Garanto-lhes, senhores leitores, que vocês não se arrependerão de terem lido, ao menos, a primeira parte do livro. Que dizer da segunda parte, onde são expostas suas reflexões sobre o escrever? Não percam tempo: procurem logo informar-se sobre o que Fischer escreveu sobre Jorge Luís Borges e seu FUNES EL MEMORIOSO. Prestem, também, atenção à distinção que Fischer propõe entre “Análise e Interpretação” (p. 184-187). Sigam adiante: na “Morte do Curdo” lerão uma crônica emocionante. Suas “Verdades gerais sobre escrever” merecem atenção de todos os escritores, tanto os envelhecidos nessa difícil arte, como os recém-inaugurados nela. Nada direi sobre “Escrever e fazer sucesso”, visto que todos, todíssimos (eu também) estamos interessados em nos tornarmos Garcia Márquez, ou no mínimo, Paulo Coelho, em termos de vendagem de exemplares.

 

Quanto à terceira parte, sobre o ENSINAR, meu Deus, o texto transborda de lições! Para já, indico dois textos: “Repetir a Informação”. E “O que é dar aula de literatura?”

 

Na quarta parte, sugiro que parem, respeitosamente, diante do necrológico de Luiz Sérgio Metz, o Jacaré, intitulado: “Égua de Pechar Trem”. Mastiguem bem o texto “Fatos Sobrálicos”. Finalmente, mergulhem a fundo nas suas “Nove Teses” sobre “Ser Professor” (estas páginas eu cito: 244-248).

 

Que acrescentar sobre o último tópico: “O autor se apresenta”? Trata-se de uma espécie de autobiografia. Confesso que sou desconfiadíssimo em termos de depoimentos autobiográficos. O único que me convence, é a primeira autobiografia da história, O LIVRO DAS CONFISSÕES DE SANTO AGOSTINHO. Posto eu considere essa parte do livro de Fischer a mais discutível da obra, mesmo assim recomendo sua leitura. Nela aparecem outras pessoas que não o autor, e são estas pessoas, em especial, que salvam o autobiografado.

 

Despeço-me com uma sugestão: professores e professoras do Rio Grande do Sul – e do Brasil: valorizem o livro-depoimento de Fischer! Se os leitores assimilarem algo de sua obra, o ensino secundário e universitário – não só de literatura – ganhará com isso. Nós, brasileiros, sairemos ganhando também, porque sairemos da caverna dos leões de Nabucodonosor, onde outrora três jovens foram jogados às feras. Neste momento, milhões de jovens brasileiros estão merecendo melhores professores. Fischer tem ainda outro mérito: é agradecido a seus Mestres, a começar pelo próprio pai! Menciona personalidades como Paulo Coimbra Guedes, Aníbal Damasceno, Flávio Loureiro Chaves, Guilhermino César, Tânia Carvalhal, J.H. Dacanal e Sandra J. Pesavento.

 

Fonte: Correio do Povo/CS/Armindo Trevisan/Escritor e crítico em 14/09/19