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Barrocos da América Latina na 10ª Bienal Mercosul
Barrocos da América Latina na 10ª Bienal Mercosul

BARROCOS DA AMÉRICA LATINA PARA DISCUTIR MESTIÇAGEM E ANTROPOFAGIA NA ARTE.

EXPOSIÇÃO NO SANTANDER CULTURAL/10ª BIENAL DO MERCOSUL

 

Diferentemente da arte oriental e de outras regiões periféricas do mundo, a produção latino-americana tem sua origem vinculada à Europa colonizadora.  Esse passado deixou como herança a formação de uma matriz artística que lida com tensões entre as culturas nativas e os valores dos colonizadores.

 

A exposição que a 10ª Bienal do Mercosul apresenta(ou) no Santander Cultural propõe(pôs) discutir as condições em que a produção latino-americana se desenvolveu desde o período colonial, processo que gerou um contexto de dependência cultural que permanece se refletindo não só na arte das Américas Central e do Sul, mas também na realidade sociopolítica dos países do continente.

 

 

ANTROPOFAGIA NEOBARROCA confronta a herança do passado colonialista e a hegemonia dos centros artísticos para refletir, na contemporaneidade, a potência artística latino-americana a partir de noções que lhes são próprias, como a mestiçagem e a antropofagia.  Nesse sentido, tem como ponto de partida os diferentes barrocos e o modo como serviram de instrumento de dominação.

 

Por isso, a reunião de uma série de obras de caráter religioso.  As imagens e esculturas sacras de diferentes Nossas Senhoras e santos lembram que o b arrocho nas Américas se manifestou dentro de um programa evangelizador, por isto político, realizado especialmente pelas missões jesuíticas.  Há obras desde Aleijadinho e Mestre Piranga até o paraguaio Zenón Paez, o colombiano Álvaro Barrios e autores do século 17 apontados como “desconhecidos” e “anônimos”.

 

 

A abordagem indígena do barroco colonial também ganha destaque, com pinturas de dois artistas tematicamente próximos, mas distantes no tempo:  os mexicanos José Maria Jara e Daniel Lezama.  São imagens fortes, que mostram os povos nativos confrontados pelo colonialismo, como FUNDACIÓN DE LA CIUDAD DE MÉXICO (1889), de Jara, e VINCENT Y PAUL EN AEMRICA (2004), de Lezama.

 

 

Em uma das galerias laterais do térreo, está a obra que mais tem reunido os visitantes em torno de sua impactante carga dramática:  TIRADENTES SUPLICIADO (1893), de Pedro Américo.  O Tiradentes esquartejado, uma das mais importantes pinturas da história da arte brasileira, está acompanhado por outra obra marcante, O DESMEMBRADO (1947), do mexicano José Clemente Orozco, e dialoga frontalmente com os desenhos de estudo de Américo que estão na galeria do lado oposto.

 

 

O lugar onde é apresentado TIRADENTES SUPLICIADO, na passagem do hall para uma das galerias laterais do térreo, permite que a obra seja vista do segundo andar, onde é oferecido um ponto de vista enriquecedor.  O mesmo vale para a escultura-instalação HELICÓPTERO (1968), de Wesley Duke Lee – no térreo, consegue-se ver apenas a redoma com pinturas, desenhos, escritos e colagens; no segundo andar, olhar de cima permite visualizar o girocóptero em seu interior.

 

Há, contudo, problemas de expografia, e um deles se dá com A RÉBIS MESTIÇA COROA A ESCADARIA DOS MÁRTIRES INDIGENTES, de Thiago Martins de Melo, que tem sua visualização prejudicada por estar na galeria lateral espremida por uma das volumosas colunas do prédio.  Como se trata de uma pintura de grandes proporções, é um tipo de trabalho que solicita um espaço mais amplo e distanciado para sua melhor apreciação.

 

 

Outro problema, como nas demais exposições desta Bienal, são algumas repetições.  Não parece haver justificativa ou conceito que sustente a grande quantidade de obras de Gilda Vogt distribuídas em diferentes espaços no Santander, assim como, novamente, a reaparição dos trabalhos com filtros de ar-condicionado manchados pela poluição de Shirley Paes Leme – eles estão nas mostras da Usina do Gasômetro, do Memorial do RS e do Margs.  E, no espaço onde é apresentado o trabalho de Sandra Cinto, o ambiente esvaziado parece indicar que ali faltaram obras para preencher as lacunas.

 

A exposição no Santander também dá a oportunidade de ver artistas brasileiros de projeção internacional, como Tunga, Beatriz Milhazes e Adriana varejão, cujas produções se relacionam à ideia de certa permanência do barroco na arte contemporânea.  Já trabalhos dos gaúchos Fernando Lindote e Britto Velho ganham uma nova chave de leitura a partir da noção de ANTROPOFAGIA NEOBARROCA trabalhada pela mostra.

 

Se há obras sacras, de temática indígena e trabalhos contemporâneos para desenvolver a tese de que o barroco se manifesta na América Latina em um sentido mestiço e antropofágico, falta à mostra no Santander uma representação mais ampla dos povos negros com origem nos escravos trazidos pelos colonizadores.  Da Jamaica, por exemplo, há apenas um trabalho, de Kimani Beckford.

 

Fonte:  ZeroHora/Francisco Dalcol (Francisco.dalcol@zerohora.com.br) em 20/11/2015