O JOGO DO STATUS
Todos queremos a alegria da aceitação. Ocorre, no entanto, que sempre estamos buscando mais
"A vida é um jogo em que todas as pessoas no planeta jogam. Ele tem regras secretas e que, silenciosamente, direcionam nossos pensamentos, crenças e ações. Esse jogo está dentro de nós. Ele é nós. E nada podemos fazer senão jogá-lo. Não existe como entender o ser humano sem antes entender esse conceito." Assim começa o livro THE STATUS GAME, do aclamado escritor e professor inglês Will Storr, ainda sem edição no Brasil.
O livro aborda a vida do ser humano e sua eterna busca por status. É importante esclarecer que status, no contexto do livro, nada tem a ver com ser famoso ou possuir riquezas. Ter status é sentir-se valorizado. Sempre que estamos na presença de outros seres humanos, consciente ou inconscientemente, estamos julgando e sendo julgados. Quanto melhor formos percebidos, mais nos sentiremos respeitados e valorizados. E mais valorização significa maior bem-estar. A literatura científica atesta que isso ocorre independentemente de cultura, sexo, idade ou personalidade.
Como espécie tribal, nossa sobrevivência sempre dependeu de sermos aceitos e vivermos em comunidade. Desde a época das cavernas, maior status significava maior influência, acesso a uma escolha mais ampla de parceiros, mais segurança e recursos para a prole. E é assim até hoje. Onde não há conexão não há proteção. É parte da nossa natureza. É o jogo da vida humana.
Todos somos compelidos a nos conectar e experimentar a alegria do pertencimento ou a agonia da rejeição. Entretanto, segundo Storr, uma vez aceitos em um determinado grupo, queremos subir e nos destacar. Somente assim nossa vida adquire propósito e significado. Essa é a pedra de toque, é o que inspira o ser humano. Sem a nossa busca instintiva por status, não haveria progresso. Não evoluiríamos como civilização. O dinheiro é apenas uma consequência. É o lado material do status.
Perseguimos objetivos como membros de um grupo colaborativo (sociedade) porque somos programados a julgar e sermos julgados. Esse conceito vale para os colegas de trabalho, os amigos do futebol, o grupo de pais da escola, os vizinhos do condomínio e por aí vai. Não basta sermos gostados, temos que ser valorizados. A sensação de ter sua proposta de negócio aprovada, de fazer um gol na pelada do fim de semana, de ver os amigos rindo da sua piada, entre tantos outros exemplos, faz parte do jogo do status.
E mais, as conquistas relativas são mais importantes do que as absolutas. Ou seja, pode-se viver perfeitamente bem numa casa simples se a vizinhança for de casas simples. Entretanto, se o vizinho construir uma mansão ao lado, a sensação vai ser de que a casa simples virou uma cabana.
Sim, existe um tabu com relação ao status, defende Storr. Segundo conceitos politicamente corretos, tendemos a nos considerar iguais aos nossos amigos. Entretanto, saiba que a competição no ranking do status é intrínseca ao ser humano. Pesquisadores identificaram que o status não está ligado ao nível socioeconômico, mas sim ao respeito e à admiração nos pequenos grupos. Estudos nas forças armadas demonstram que a fonte de motivação dos soldados são os companheiros de tropa, e não os líderes superiores e distantes.
Um dos exemplos preferidos de Storr é o caso do suco de laranja. Imagine um grupo de amigos sentados à mesa. Ao serem servidos de suco, um deles recebe uma quantidade visivelmente menor. Instintivamente esse indivíduo sentirá um incômodo que não terá nada a ver com sua sede, mas sim com o sentimento de desvalorização perante o grupo.
Storr conclui que não há final feliz. Para se estar vivo e psicologicamente saudável é preciso ter a consciência de que não existe aquela vitória final, aquele último pico a ser escalado para alcançarmos a felicidade definitiva. Isso é uma ilusão. Nunca chegaremos lá. Estaremos sempre jogando o jogo do status, sempre querendo mais.
Uma das explicações para esse jogo sem fim é que o status nunca poderá ser definitivamente possuído. O dinheiro pode ser guardado no cofre; o status, não. O status estará sempre sendo medido e comparado com o grupo, não importa o tamanho da riqueza do indivíduo. Dependendo das suas atitudes e das atitudes dos seus pares, o status de hoje poderá não ser o de amanhã. Por isso o ser humano sempre anseia por mais.
O jogo do status é o pior de nós e, ao mesmo tempo, o melhor. É a nossa verdade inescapável. É como criamos a nossa identidade, como evoluímos como indivíduo e como sociedade. É um jogo que nunca termina. Para os humanos a igualdade sempre será uma utopia, um sonho impossível.
Fonte: Zero Hora/Caderno DOC/Fernando Goldsztein/Empresário, fundador do The Medulloblastoma Initiative em 30/04/2023