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Que Horas Ela Volta?: da Cineasta Anna Muylaert
Que Horas Ela Volta?: da Cineasta Anna Muylaert

ENCONTRO DE RELAÇÕES DE TRABALHO E AFETO

 

O FILME ‘QUE HORAS ELA VOLTA?’ FOI UM DOS DESTAQUES DA PRODUÇÃO DE CINEMA BRASILEIRO EM 2015.

 

O longa-metragem QUE HORAS ELA VOLTA? Foi eleito o Melhor Filme Brasileiro de 2015 pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine).  Esta comédia dramática dirigida pela cineasta Anna Muylaert (SP) se tornou, portanto, um dos destaques da produção nacional da última safra.  O filme abriu o Festival de Cinema de Gramado deste ano, mas acabou desclassificado e exibido fora de competição por não cumprir um item do regulamento.  Sua carreira, porém, havia começado anteriormente no exterior, quando integrou a 31ª edição do Festival de Cinema de Sundance (EUA), em fevereiro passado.  Com o título em inglês “Second Mother” (SEGUNDA MÃE), ganhou o Prêmio Especial do Júri na categoria Atuação para as protagonistas Regina Casé e Camila Márdilla, que vivem mãe e filha respectivamente na trama.  E, em setembro, o filme foi anunciado pela Comissão Julgadora do Ministério da Cultura como o escolhido para representar o Brasil na luta por uma das cinco vagas dos indicados ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro 2016.

 

O drama apresenta a história da empregada doméstica nordestina Val (Regina Casé), que trabalha em São Paulo com uma família rica.  Val deixou sua filha, Jéssica (Camila Márdilla), ainda pequena na sua cidade natal.  Enviava dinheiro mensalmente para a pessoa que cuidava dela no Nordeste.  Até que a filha cresce e resolve visitar a mãe em São Paulo, com o objetivo de prestar vestibular.  A chegada da jovem dispara um a série de reviravoltas para os personagens.  Desta forma, a história aborda questões como maternidade, desvalorização do trabalho doméstico e desigualdades sociais.   Reflete também sobre os relacionamentos de famílias de bom poder aquisitivo com as trabalhadoras de suas casas, especialmente entre os filhos criados por babás.  Val cria o filho (Michel Joelsas) do casal rico (Karine Teles e Lourenço Mutarelli).  Para ela, ele se torna também um filho, e ela, por sua vez, uma mãe “adotiva” com quem tem mais espontaneidade do que com a mãe biológica.  E Val vive na corda bamba de, ao mesmo tempo, ser e não ser “da família”.

 

O questionamento que se faz não é apenas sobre o trabalho doméstico, que pode ser satisfatório para ambas as partes, mas à herança colonialista que chega até os dias de hoje e mostra que alguns hábitos próximos da escravidão ainda se perpetuam em certos segmentos.

 

“Me intriga que o trabalho tido como enfadonho é, na verdade, o sagrado, o nobre, como criar um filho.  Por isso, questiono a desvalorização da mulher”, disse a diretora em Gramado.  Esta temática, da relação de famílias de classe média ou alta com suas domésticas, já foi abordada recentemente no cinema brasileiro com O SOM AO REDOR, do pernambucano Kleber Mendonça Filho (2013), que inclui ainda a especulação imobiliária e a paranoia da falta de segurança; e CASA GRANDE, do carioca Fellipe Barbosa (2014), sobre o choque de uma família rica que empobrece.  Em relação a estes dois filmes anteriores, a própria diretora afirma que usou ângulos diferentes: “Os outros longas abordaram o tema pelo ponto de vista da sala e eu pelo da cozinha”, avaliou.

 

São filmes, portanto, que enfocam histórias urbanas, mas fogem da temática recorrente das favelas.  Questionam as opressões cotidianas e acabam por formar um mosaico sobre a sociedade brasileira.

 

 

Fonte:  Correio do Povo – CS Caderno de Sábado/Adriana Androvandi (crítica de cinema do CP) em 2 de janeiro de 2016.