Dia Europeu das Línguas - Centro Linguístico Di Ateneo da Universidade Federico II de Nápoles, Itália
Linguística – uma ciência moderna
A Linguística corresponde ao estudo científico da linguagem humana. Assim como ocorre em outras ciências, podemos ter diferentes maneiras de compreender o mesmo objeto de estudo.
A partir de uma metodologia bem definida, busca-se sistematizar as observações sobre a linguagem, relacionando-as a uma teoria construída para esse propósito.
Desse modo, podemos concluir que o trabalho dos linguistas, cientistas que se dedicam à Linguística, é estudar a linguagem humana através da observação de como as línguas naturais se estruturam e funcionam, a fim de se obter não só descrições adequadas dessas línguas naturais, mas também entender mais sobre a natureza da linguagem.
Embora a escrita também seja considerada pela Linguística, cabe dizer que seu foco principal é a língua falada, uma vez que é a modalidade de uso da língua desenvolvida naturalmente pelo indivíduo a partir do contato com seus familiares.
Depois de rever os objetivos da investigação linguística, vamos continuar a nossa revisão e abordar a relação entre Linguística e doutrina gramatical. Começaremos com uma citação que ilustra, muitíssimo bem, essa relação:
“A Linguística não se compara ao estudo tradicional da gramática; ao observar a língua em uso o linguista procura descrever e explicar os fatos: os padrões sonoros, gramaticais e lexicais que estão sendo usados, sem avaliar aquele uso em termos de um outro padrão: moral, estético ou crítico.” (PETTER, Margarida. Linguagem, língua e Linguística. In. FIORIN, José Luiz. Introdução à Linguística. São Paulo: Contexto, 2002, p. 17).
1 - “Os livros chegaram.”
2 - “Os livro chegou.”
O que um linguista e um gramático diriam sobre os exemplos apresentados em (1) e (2)?
Um gramático diria que apenas (1) está de acordo com a prescrição e que (2) apresenta um “erro” em relação às regras de concordância. E o linguista? Qual seria o seu comentário?
Sabemos que a Linguística, por conta de seu caráter científico, não julga os enunciados de uma língua. Não há preconceitos ou rótulos de “certo” e “errado” no que se refere a construções comumente observadas no uso da língua. Por isso, um linguista, ao analisar os exemplos (1) e (2), diria que ambos são enunciados lógicos e coerentes, comuns nos contextos comunicativos da Língua Portuguesa. O exemplo (2), embora siga um modo de combinação que difere daquele apresentado nas gramáticas normativas, apresenta regras gramaticais próprias.
Analise as falas dos personagens abaixo, tendo como base o papel do linguista e do gramático. Não se esqueça de levar em consideração o perfil de cada falante.
Escutei-o no tribunal, e não há dúvidas de que a declaração apresentada não é verdadeira.
Paulo Cohen → carioca, 65 anos, juiz titular da 1ª Vara do Juizado Especial Criminal, sobre o depoimento do senhor Marcos Mattos.
O carro do dotô tá muito amassado. A gente vamo começá a arrumá ele assim que os home do seguro liberá.
Ademir Silva → carioca, 52 anos, mecânico, analfabeto, morador da periferia, sobre o conserto do carro do juiz Paulo Cohen.
Menino o saiu casa de loiro e nave comigo na voar foi.
E.T. → proveniente de outro planeta, aproximadamente 3.200 anos-luz, sobre seu amigo, um garoto americano de dez anos.
Os personagens apresentam usos distintos da língua portuguesa que serão avaliados diferentemente pelo linguista e pelo gramático.
Para o linguista, que não tem como objetivo fazer julgamentos de correto-incorreto, as falas do juiz e do mecânico estariam adequadas ao contexto comunicativo em que se encontram. As construções utilizadas refletem o nível de escolarização dos personagens. Por exemplo, o juiz, por ser altamente escolarizado e estar em uma situação comunicativa formal, faz uso do pronome oblíquo “o” para se referir ao senhor Marcos Mattos. Por sua vez, o mecânico Ademir, analfabeto, usará o pronome “ele” na função de objeto direto (“arrumá ele”).
Para o gramático, que considera um determinado uso da língua como correto, apenas a fala do juiz estaria correta, pois há muitos usos, na fala do mecânico, que não condizem com a prescrição.
O linguista e o gramático diriam que a fala do E.T. é agramatical, pois sua construção não obedece às regras de funcionamento da nossa língua, à gramática intuitiva que cada falante tem. O extraterrestre, como não é um falante nativo do português, apresenta uma construção com um modo de combinação possível no português.
As correntes da Linguística:
Já entendemos que Linguística corresponde ao estudo científico da linguagem humana. Assim como ocorre em outras ciências, podemos ter diferentes maneiras de compreender o mesmo objeto de estudo. Desse modo, a Linguística apresenta algumas correntes teóricas, que vão investigar a linguagem humana sob perspectivas diferentes. Vamos a uma breve apresentação de algumas delas. Teremos como foco as correntes linguísticas que serão abordadas em nossa disciplina, a saber: Gerativismo, Sociolinguística e Funcionalismo. Vale dizer que há outras não menos importantes.
Costuma-se atribuir o nascimento da Linguística moderna no ano de 1916 à publicação do Curso de Linguística Geral, obra do linguista suíço Ferdinand de Saussure. Sabemos que, na realidade, as bases da Linguística moderna já haviam sido lançadas ao longo do século XIX a partir do trabalho de muitos linguistas que tinham como foco os estudos de comparação entre línguas diferentes.
As ideias de Saussure, apresentadas no CLG, ganharam tanto destaque que, no século XX, surge uma das mais importantes escolas científicas: o Estruturalismo, que firmou sua influência não só na Linguística, mas também em outras áreas como a Sociologia, a Antropologia, a Psicanálise, a Filosofia etc.
O estruturalismo de Saussure, embora considere a “língua” como um fato social, se atém ao caráter formal e estrutural do fenômeno linguístico, uma vez que a concebe como uma estrutura.
Em 1957, o linguista Noam Chomsky promove uma verdadeira revolução nos estudos da linguagem ao propor uma abordagem caracterizada pela ausência do componente social: a língua passa a ser vista como um fenômeno mental. Para Chomsky e sua teoria Gerativa (ou Gerativismo), a capacidade humana de falar e entender uma língua é o resultado de uma capacidade genética. Seu objetivo era propor uma teoria explicativa que pudesse contemplar não só as frases realizadas, mas também aquelas que seriam, potencialmente, produzidas pelo falante.
Como uma reação aos modelos formais de análise linguística do Estruturalismo e do Gerativismo, na década de 1960, nos Estados Unidos, surge a Sociolinguística, que, na sua vertente variacionista, tem como nome principal o linguista William Labov. A Sociolinguística propõe novamente a focalização do aspecto social, mas sob o ponto de vista da variação e a possibilidade de sistematizá-la. Assim, tem-se como pressuposto teórico a ideia de que toda língua muda com o tempo e varia em função de aspectos geográficos e sociais.
Em 1975, as análises funcionalistas ganham destaque na linguística norte-americana a partir dos trabalhos de Dwight Bolinger. Ainda como uma oposição às ideias estruturalistas e gerativistas, surge uma teoria que tem como objetivo explicar a língua com base no contexto linguístico e na situação extralinguística: o Funcionalismo, corrente teórica que tem como foco de interesse a relação entre estrutura gramatical das línguas e os contextos de comunicação em que são utilizadas. Sobre o Funcionalismo europeu, Cunha (2009) afirma: “atribui-se aos membros da Escola de Praga, que se originou no Círculo Linguístico de Praga (...), as primeiras análises na linha funcionalista.” (p.159).
A Linguística é a salvação?
Depois de conhecermos, brevemente, outras correntes linguísticas, vamos encerrar a nossa primeira aula, refletindo sobre o papel da Linguística na formação do futuro professor de Língua Portuguesa.
À medida que conhecemos melhor as correntes gerativistas, sociolinguísticas e funcionalistas, vamos ampliando a nossa visão sobre a língua e passamos a refletir sobre a aplicação dos resultados das pesquisas linguísticas nessas áreas na questão do ensino. Como as inovações introduzidas pela Linguística podem nos ser úteis para tratar algumas ideias preconcebidas e amplamente difundidas pela doutrina gramatical?
Sobre esse aspecto, é preciso ter cuidado. Retomamos um trecho do item “A salvação na Linguística?”, de Celso Pedro Luft (1997):
“Nenhum ensino em crise pode ser salvo pela simples troca de uma teoria por outra, ainda que esta, como a Linguística, seja do mais alto nível científico. Porque não é esse o problema.(...)
O lugar da Linguística, antes de mais nada, é nos cursos de graduação e pós-graduação, onde é ministrada a futuros técnicos, pesquisadores, especialistas do ramo, professores, autores de livros didáticos.
Ensinar Linguística no 1º e 2º Grau é uma insensatez. As teorias gramaticais estão em evolução constante, sua abordagem exige maturidade mental, capacidade de reflexão e abstração.
O que a Linguística traz de positivo ao ensino de línguas são as noções fundamentais de linguagem e língua, de variedades e registros; a noção de que não há língua que não evolua; a noção de que o uso e os fatos devem prevalecer sobre preconceitos normativistas – sobretudo, a noção de que a língua é um saber interior, pessoal, dos falantes, de onde o ensino deve partir e em que deve, sempre, se basear. (LUFT, 1997: 97)
Mas tudo isso é o embasamento teórico imprescindível que deve guiar o professor em suas aulas práticas, e não se transformar em matéria de ensino. O ensino tem de ocupar-se com o manejo efetivo da língua, falada e escrita.”
(LUFT, Celso Pedro. Língua e liberdade: por uma nova concepção da língua materna e seu ensino. Porto Alegre: L&PM, 1985, p.96-97.)
Hoje, não é mais possível conceber um ensino que não considere os avanços trazidos pelas pesquisas científicas em relação aos fenômenos linguísticos. Felizmente, o Ministério da Educação está atento a isso. Vale destacar, no entanto, que essas reflexões devem fazer parte apenas da formação do professor de Língua Portuguesa. Como salientou Luft, não podemos “trocar uma teoria por outra” (p.96).
Vamos iniciar com um desafio. Analise os dois enunciados abaixo:
Você é bonita.
Bonita é você.
Você acha que podemos usar o enunciado (1) e o enunciado (2) em qualquer contexto ou que há contextos que vão favorecer a utilização de (1) e não de (2)?
O desafio é criar dois contextos distintos: um em que, certamente, usaríamos o enunciado (1) e outro em que usaríamos o (2). Vamos ao trabalho?
Cena 1
Minha nossa! Não sei com qual roupa irei ao encontro de hoje com o João. Além disso, meu cabelo está horrível!
Você é bonita. Não se preocupe! Você ficará bem com qualquer roupa.
Cena 2
Menina! Sua pele é ótima! Seu cabelo é incrível! Adorei o seu visual! Você é bonita!
Que nada! Bonita é você.
Você, provavelmente, criou contextos muito próximos dos apresentados aqui. Intuitivamente, perceberam uma diferença nas sentenças, já que não tiveram dificuldades de pressupor em qual situação comunicativa o enunciado (1) seria utilizado e não o (2), ou vice-versa.
A tarefa nos leva a pensar se devemos tratar esses enunciados como sentenças diferentes ou como versões alternativas para dizer a mesma sentença. Vamos refletir sobre isso com base no Funcionalismo?
Um breve histórico do Funcionalismo: o funcionalismo europeu e o surgimento do funcionalismo americano.
O Funcionalismo surge como um movimento da corrente estruturalista. Muitos autores (CUNHA, 2009; CUNHA, OLIVEIRA & MARTELOTTA, 2003) atribuem aos linguistas do Círculo Linguístico de Praga, fundado em 1926, as primeiras análises de cunho funcionalista, pois, para eles, a língua é um “sistema funcional” e, por isso, deve ser usada para um determinado fim. As ideias dos funcionalistas de Praga foram fundamentais para os trabalhos de orientação funcionalista que surgiram posteriormente.
Círculo Linguístico de Praga
“O nome da Escola de Praga é associado frequentemente ao de F. de
Saussure, embora ela não tenha sido reivindicada pelo linguista genebrês. O laço estabelecido entre ambos se explica mais pelos traços comuns desencadeados a posteriori do que por um parentesco genético. A atividade da escola de Praga se estende de outubro de 1926 a Segunda Guerra mundial; se os participantes dos Trabalhos foram numerosos (contam-se entre eles Français L. Brun, L. Tesnière, J. Vendryès, É. Benveniste, G. Gougenheim, A. Martinet), os protagonistas foram incontestavelmente S. Karchevski, R. Jakobson e N. S. Trubetskoi. As teorias (chamadas “teses”) da escola de Praga, apresentadas em 1929, se encontram ilustradas principalmente nos oito volumes dos Trabalhos do Círculo de Linguística de Praga, publicados de 1929 a 1938.
A metodologia do Círculo de linguística de Praga se fundamenta sobre uma concepção da língua analisada como um sistema que possui uma função, uma finalidade (a de se exprimir e de se comunicar) e, em consequência, com os meios próprios a este fim. Sem considerar intransponível a distinção entre método sincrônico e método diacrônico, os linguistas do Círculo de Praga se preocupam mais com os fatos da língua contemporânea, porque só estes últimos constituem um material completo nos quais se pode ter um ‘sentimento direto’. A comparação das línguas não deve ter por único fim considerações genealógicas; com efeito, ela pode permitir o estabelecimento de tipologias de sistemas linguísticos sem parentesco algum. Estabelecem-se, assim, as leis que dão conta do endeamento de fatos, já que, no domínio da língua, existia a tendência de explicar as mudanças isoladas e produzidas acidentalmente.” (Praga (Escola de). In: Dubois, J. et al. Dicionário de linguística. São Paulo: Cultrix, 2006.)
Os linguistas de Praga focalizavam as funções associadas à organização interna do sistema linguístico como na fonologia. Os modelos funcionalistas mais recentes ocupam-se em investigar “as funções que a linguagem pode desempenhar nas situações comunicativas, dando maior ou menor peso aos aspectos cognitivos relacionados à comunicação.” (CUNHA, 2009, p.159)
Na década de 70, na Costa Oeste dos Estados Unidos, como uma reação à linguística formalista, realizada pelos estruturalistas e pelos gerativistas, surge o Funcionalismo norte-americano:
“É por volta de 1975 que as análises linguísticas explicitamente classificadas como funcionalistas começam a proliferar na literatura norte-americana. Essa corrente surge como reação às impropriedades constatadas nos estudos de cunho estritamente formal, ou seja, nas pesquisas estruturalistas e gerativistas. Os funcionalistas norte-americanos advogam que uma dada estrutura da língua não pode ser proveitosamente estudada, descrita ou explicada sem referência à sua função comunicativa (...)” (Cunha, 2009, p. 163)
Tendo como foco uma liguística baseada no uso, os linguistas Sandra Thompson, Paul Hopper e Talmy Givón se destacaram como funcionalistas. Em seus trabalhos, é possível perceber a tendência em considerar o contexto linguístico e a situação extralinguística nas análises. Acesse o link e veja as informações SOBRE A OBRA “FUNCIONALISM AND GRAMMAR”, DE TALMY GIVÓN.
No Brasil, estudos de base funcionalista começam a se destacar na década de 80, a partir dos trabalhos de pesquisadores preocupados em investigar os fatores comunicativos e cognitivos para entender o funcionamento da língua falada e escrita.
Os Conceitos de Língua e de Linguagem Segundo a Proposta Funcionalista
Tendo como base o Funcionalismo, vale refletir sobre o modo como a língua e a linguagem são concebidas. Deixa-se de lado a ideia de que a linguagem é a forma de expressão do pensamento, já que os funcionalistas a concebem como instrumento de interação social. Segundo eles, é preciso investigar a motivação para os fatos da língua, ou seja, explicar as regularidades observadas no uso interativo da língua, uma vez que ela é concebida como uma estrutura maleável, adaptativa.
Assim, estuda-se a língua em situação real de comunicação, verificando o modo como os usuários da língua se comunicam eficientemente. Esses usuários são vistos como os responsáveis pelo estado e forma da língua.
Para os funcionalistas, em um contexto comunicativo real, não há dois modos distintos de dizer exatamente a mesma coisa. Por isso, deve-se ter como ponto de partida, em um estudo linguístico, a função.
Você é bonita.
Bonita é você.
No desafio proposto no início, reconhecemos a importância do contexto de uso. Se observássemos apenas o caráter sintático, não conseguiríamos entender por que um indivíduo utilizaria “Você é bonita” ou “Bonita é você”. Percebemos que o segundo enunciado só poderia ter sido produzido em um contexto de “réplica”. Por isso, segundo o Funcionalismo, não podemos ignorar o contexto, pois, no caso apresentado, a organização sintática do enunciado é motivada pelo contexto discursivo em que ela ocorre.
Nesse sentido, segundo a visão funcionalista, “a gramática de uma língua natural nunca é estática e acabada (...). A gramática é entendida como o sistema formado pelas regularidades decorrentes das pressões do uso. Essas pressões estão relacionadas a um complexo de interesses e necessidades discursivas/pragmáticas fundamentais que podem compreender os propósitos comunicativos do falante de ser expressivo e informativo ou o fenômeno da existência de lacunas nos paradigmas gramaticais ou no universo de conceitos abstratos.” (MARTELOTTA et al., 1996, p. 11)
O Papel dos Marcadores Discursivos
Amigos, como vão? Sabe, estou muito preocupado com uma coisa!
Uai, o que está acontecendo? É difícil, né, quando ficamos preocupados assim...
É sim, mas sabe o que é? Não sei se troco meu carro ou guardo o dinheiro para uma viagem...
Pois é, dúvida cruel, né!
É sim, mas vou pensar direitinho!
Vocês já devem ter percebido que as pessoas, em contextos de fala espontânea usam uma série de elementos, tais como “né?”, “sabe?”, “entende?”, “tipo assim”. Pois é, a visão tradicional costuma rotular esses elementos como “vícios de linguagem”.
No entanto, o Funcionalismo já que busca, no contexto discursivo, a motivação para os fatos da língua, mostra-nos que esses elementos, chamados “marcadores discursivos”, são usados para “reorganizar a linearidade das informações no nível do discurso, quando essa linearidade é momentaneamente perdida por diversos motivos como insegurança ou falhas de memória, e, apenas subsidiariamente, para organizar as relações textuais. Sua função em nível do discurso se motiva na medida em que a natureza fluida da fala impede uma perfeita linearidade das informações”. (MARTELOTTA et al., 1996, p. 61)
Exemplo:
Entrevistador: Rosilda, agora conta pra mim uma história que tenha::/ que alguém tenha contado pra você... que você tenha achado interessante...
Informante: bom... a colega minha... Neide... falou pra:: Lenira... que descobriu que eu estava saindo com o namorado dela... né? mas... isso é mentira... porque eu não saí com o namorado de ninguém... entendeu? mas eu nunca... nunca me atrevi a sair com o namorado de ninguém... com::/ ou paquerar namorado... de colega minha não... eu acho (covardia)... quer sair com o cara ou com o namorado... a gente mesmo tem que arranjar... né? concorda comigo? ((riso)) eu acho isso... mas... olha... elas deixaram de falar comigo... por causa dessa bobeira... né? ontem mesmo a professora perguntou por que o motivo da... fofoca... que a garota falou pra mim que ela tinha falado... aí eu falei pra ela que... eu nunca tinha saído com o namorado dela não... e se ela deixava de falar comigo... problema dela/
(Narrativa recontada, página 289, Corpus do Grupo Discurso & Gramática supletivo)
Em um contexto de fala espontânea, o discurso é planejado no momento da interação, diferentemente do que ocorre em contextos de língua escrita, em que temos tempo para organizar as informações. Daí a dificuldade que temos em manter a linearidade. Segundo Martelotta et al. (1996, p. 62), “a fala, portanto, é marcada por constantes pós-reflexões, reavaliações e adendos, ou seja, por uma frequente reorganização. Os marcadores são usados para viabilizar o processamento das informações na fala, no sentido de marcar para o ouvinte essas reformulações e de ajudar o falante a ganhar tempo para reorganizar suas ideias”.