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Teoria da Literatura
Teoria da Literatura

SERIA A LITERATURA UM TIPO ESPECIAL DE LINGUAGEM?

LITERARIEDADE                  

É a qualidade inerente ao texto literário.

 

Podemos continuar a busca por uma resposta a partir das propostas de um grupo de linguistas: os formalistas russos. No começo do século XX, esse grupo propôs-se a construir uma Ciência da Literatura e tiveram como uma preocupação fundamental determinar o que denominavam Literariedade. Os formalistas russos relacionaram a Literariedade ao tipo de linguagem empregado nos textos. O texto portador de Literariedade e, consequentemente, literário é aquele cuja linguagem difere radicalmente da fala utilizada em nosso cotidiano: possui linguagem literária, também denominada linguagem poética.

 

A linguagem poética opõe-se de modo tão intenso à fala comum por várias razões: por ser experimental e plurissignificativa, por colocar a linguagem em primeiro plano, podendo ser ornada e conotativa, empregar figuras de linguagem e apresentar paralelismos, musicalidade, ritmo, rimas, desvios da norma e neologismo.

 

Segundo os critérios citados, poderíamos considerar o poema a seguir, de Vinícius de Moraes, como um texto literário, por organizar-se em torno da combinação das características referidas, como a experimentação da linguagem, a conotação e a plurissignificância, presença de ritmo e o emprego da assonância, da aliteração, de linguagem metafórica e antitética:

 

POÉTICA

Rio de Janeiro, 1954

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
— Meu tempo é quando.

Nova York, 1950

 

Assim, os formalistas russos identificaram o texto literário como aquele dotado de Literariedade e a relacionaram ao emprego de um tipo especial de Linguagem: a linguagem literária, extremamente diversa da linguagem cotidiana. O modo como a linguagem literária estaria estruturada derivou o conceito de Estranhamento: sua peculiar construção linguística provocaria no receptor uma sensação de estranheza e o levaria a uma atenção especial, capaz de despertá-lo de uma percepção automática da realidade.

 

A aparente tranquilidade advinda da proposta formalista para definir a condição do literário esbarra em alguns questionamentos, entretanto, podemos pensar em como a ideia de uma “fala comum” é uma convenção. Uma linguagem considerada cotidiana em uma dada região e/ou em certo grupo pode soar absolutamente estranha para outras pessoas e/ou em um local diverso.

 

EXEMPLO:

Brother,

Que lugar maneiro este!

 

A linguagem utilizada por universitários cariocas, provavelmente, soaria estranha à população ribeirinha, às margens do Amazonas e vice-versa.

 

Do mesmo modo, um texto escrito há trezentos anos pode empregar uma linguagem da época, considerada como cotidiana, embora, por conta da lacuna temporal, hoje soe como elaborado, poético e sofisticado. O afastamento da linguagem comum e o estranhamento causado pela linguagem do texto literário são, portanto, elementos relativos.

 

Outro ponto a problematizar é a presença de elementos associados à linguagem literária em textos que dificilmente seriam considerados como literários. Um hino de torcida de futebol pode apresentar ritmo, musicalidade e linguagem conotativa, repleta de metáforas, por exemplo, e não ser considerado como manifestação literária.

 

Em contraposição, um texto não necessariamente tão afastado da linguagem cotidiana pode vir a ser considerado como literário, como podemos perceber ao lermos boa parte dos romances da chamada segunda fase modernista, a “Geração de 30”. São textos literários elaborados em torno de uma linguagem literária propositalmente próxima à cotidiana. Essa opção foi proposital e estava em consonância com a percepção da obra literária como um elemento de reflexão social e denúncia das fraturas da sociedade.  

 

Os próprios formalistas russos estavam cientes das limitações acerca da definição da literariedade.  Em nenhum momento desejaram definir o que fosse a Literatura, mas os mecanismos capazes de tornar um texto literário, configuradores da Literariedade. Mesmo esse conceito revelou-se lábil, como o próprio Roman Jakobson assumiria algumas décadas mais tarde, ao comparar a definição da linguagem poética à instabilidade das fronteiras chinesas.

 

De fato, não há uma fórmula pronta, capaz de designar o que é Literatura, tampouco de aferir o índice de literariedade de um texto. As características indicadas pelo critério ficcional e linguístico podem ser combinadas de modo diferentes.

 

Isso se dá porque a definição do literário não ocorre de modo estável e ontológico, como em outros campos do saber, mas de modo funcional.  

 

Podemos definir de modo ontológico o conceito de mamífero, pois este tem uma essência, uma designação clara, “da coisa em si”.  É possível afirmar, sem receio, a condição da baleia como um animal mamífero, por exemplo.

 

A definição de Literatura não é ontológica, pois, como vimos, não há como objetivar de modo determinante elementos que caracterizem um texto como literário. Trata-se de uma definição funcional, pois não se refere a características e estados estáveis. É uma definição atrelada às funções desempenhadas por um dado texto em certo momento e /ou sociedade e às práticas e discursos conformados em torno dele. Ao considerarmos a Literatura como um conceito funcional, verificamos o seu caráter histórico, dinâmico e social.

 

O conceito de Literatura é social, pois a obra literária é um objeto de interação estética e que prevê a integração entre autor, obra e público leitor. A sua concepção como literária depende de circulação, pois o estatuto de literário é conferido a um texto por juízos de valores emitidos por uma sociedade.

 

Portanto, os valores são mutáveis, de acordo com o grupo, com os critérios e os objetivos que os envolvam. Logo, o valor de literário atribuído a um texto pode ser modificado ao longo dos anos, o que explica a dimensão histórica e dinâmica do conceito de Literatura. Na verdade, a leitura de uma obra em tempos e/ou espaços diversos imprime também apreensões variadas de seus significados.

 

Para ilustrar o que dissemos, podemos apontar o caso da obra do escritor Coelho Neto, hoje praticamente no ostracismo, mas considerada como literatura de altíssima qualidade, durante a virada do século XIX para o século XX. O mesmo grupo social que incensava a obra desse autor não valorizou tanto a obra de Lima Barreto, pois, à época, esta não se adequava aos códigos e discursos vigentes acerca do literário.

 

Atualmente, a obra de Lima Barreto é vista como de extrema qualidade literária. Mas, como os juízos de valores elaborados pelos grupos sociais são dinâmicos, nada nos garante a permanência desse olhar valorativo sobre ela, pois um autor pouco valorizado em nosso tempo pode vir a ser percebido como um produtor de alta literatura, posteriormente.

 

CÂNONE LITERÁRIO

Cânone literário é o conjunto de obras literárias consideradas como de alta relevância e qualidade por um grupo social. A formação do cânone implica em um processo de inclusão e de exclusão, pautado nas percepções estéticas de determinados grupos e instituições vistos como canais competentes, como associações literárias, escolas, universidades, conselhos de premiação, a crítica especializada e a própria mídia. Trata-se de um processo dinâmico, em permanente reconstrução.

 

O conceito de clássico dialoga com a ideia de cânone. Um texto clássico é considerado como de excelência reconhecida. 

 

Por que ler os clássicos?

 

“Os clássicos são aqueles livros que chegam até nós trazendo consigo as marcas das leituras que precederam a nossa e atrás de si os traços que deixaram na cultura ou nas culturas que atravessaram”.

 

Definição de clássico:

 

Relativo à arte, à literatura ou à cultura dos antigos gregos e romanos.

 

Que segue, em matéria de artes, letras, cultura, o padrão desses povos.

 

Da mais alta qualidade; modelar, exemplar.

 

Cujo valor foi posto à prova do tempo; tradicional; antigo.

 

Que segue ou está de acordo com os cânones ou usos estabelecidos ou que é conforme com um ideal; tradicional. Famoso por se repetir ao longo do tempo; tradicional.

 

Usado nas aulas ou classes.

 

Diz-se da obra ou autor que, pela originalidade, pureza de língua e forma perfeita, se tornou modelo digno de imitação.

 

O clássico remete à ideia de classe, de sala de aula. Em sua dinâmica, o cânone literário possui como instrumento potente de validação o estudo, a recomendação e a discussão dos seus textos pelas instituições de educação formal.

 

Podemos citar Machado de Assis, Graciliano Ramos e João Cabral de Melo Neto como autores de obras clássicas e consideradas como parte do cânone literário brasileiro. Vale lembrar que escritores não considerados canônicos, em certa época, podem ser integrados ao cânone literário muito tempo depois, como ocorreu com a obra do poeta seiscentista Gregório de Matos: recuperada pelos românticos brasileiros e considerada, até os nossos dias, clássica.

 

CONCEITO DE MIMESE:

A mimese diz respeito aos modos como o texto literário representa a realidade.

 

A obra literária não é mera produção da realidade, mas uma representação criativa. O real é reinventado pela literatura.

 

Polissemia e liberdade ficcional.

 

LITERATURA: CONCEITOS

A literatura é tradicionalmente entendida como uma arte verbal. A arte da palavra, segundo Aristóteles. Mas isso diz pouco. Mesmo porque, durante longo tempo, limitava-se às composições em versos

 

Considerando o termo, em sentido restrito, a partir de uma perspectiva estética, isto é, como equivalente à criação estética, o conceito de literatura, como acontece com outros fatos culturais, não é matéria pacífica entre os estudiosos que a ela se dedicam.

 

Teoria da Literatura: o que é?

No post anterior, vimos o conceito de Literatura e as suas possibilidades de definição. Vimos que se trata de um conceito complexo, funcional e dinâmico, pois é elaborado a partir de juízos de valores presentes em certos contextos sociais e históricos.

 

Neste, convidamos você a pensar sobre a nossa teoria, que toma como objeto de estudo privilegiado o fenômeno literário. Do que se trata a Teoria da Literatura? E qual a sua função?

 

Antes de indagarmos sobre a Teoria da Literatura, convém refletirmos sobre a própria noção de Teoria. Não é incomum encontrarmos no discurso do senso comum o emprego do termo “teoria”.

 

Geralmente, esse termo designa um palpite, uma hipótese, uma ideia, que pode ser ou não confirmada. Veja abaixo um bom exemplo:

 

Qual é a sua teoria sobre o comportamento de Maria?

 

A minha teoria é que Maria estava triste, pois seu namorado viajou.

 

A minha teoria é que Maria estava estranha por conta da sua timidez.

 

Em seu livro Teoria Literária: uma introdução, Jonathan Culler defende que o sentido dado pelo senso comum à ideia de teoria não se sustenta, pois:

- A teoria é uma especulação: demonstrar a falsidade ou a verdade de uma ideia teórica é difícil. Ao contrário, a noção empregada pelo senso comum é a de uma hipótese que pode ser ou não confirmada.

- a teoria é mais do que uma hipótese: não é óbvia e envolve um considerável grau de complexidade.

 

Portanto, o que estamos chamando de teoria não envolve o sentido dado pelo senso comum e que costumamos ouvir em nosso cotidiano. O que chamamos de teoria é um conhecimento especializado, consistente e profundo. O conhecimento teórico modifica o sujeito, pois redimensiona a visão de mundo daquele que o procura, já que é instigante e provocador.

 

A TEORIA É UM SENSO COMUM

Como vimos, a teoria não pode ser confundida com o senso comum, pois é um saber questionador, sistemático e complexo e de forma contrária, problematiza e põe em xeque o conhecimento gerado pelo senso comum.

 

O discurso da teoria tem como objetivo questionar as ideias tomadas como verdades e trazer à tona as suas contradições e lacunas.

 

A teoria e o estudo da Literatura:

 

Como crítica ao senso comum, a teoria investiga nos estudos de literatura uma série de considerações. Culler cita algumas em seu referido livro:

- O que é um autor?

- O que é ler?

- Como os textos relacionam-se às circunstâncias de sua produção?

 

As respostas para perguntas como essas não são óbvias, como poderiam parecer à primeira vista. Também não operam em torno de critérios de verdadeiro ou falso; são reflexões elaboradas e consistentes, que não buscam a verdade, mas a validade, como disse o crítico Roland Barthes, em sua obra Crítica e verdade.

 

Conheça um pouco mais sobre Roland Barthes!

 

Sabemos que o seu conhecimento é muito importante e que a sua participação para nós é indescritível. Deixe um recado para nossa equipe sobre o que aprendeu. Agradecemos a sua participação.

 

A teoria, portanto, duvida de qualquer afirmação tranquila e tomada como verdadeira. Se voltarmos a uma das perguntas elencadas por Culler, “o que é um autor?”, por exemplo, perceberemos como os estudos de teoria podem desestabilizar convicções e respostas padronizadas.

 

No lugar de uma resposta ingênua, como “O autor é o sujeito que escreveu a obra”, os estudos teóricos forneceram elementos a diversos pensadores e críticos para uma problematização mais complexa.

 

Assistimos, no início do século XX, à emergência de correntes da crítica literária que esvaziaram o papel preponderante do autor nos processos de significação e análise da obra: as correntes formalistas. Elas propunham uma análise imanente do texto literário: desprezavam os elementos externos às obras em seus estudos e, consequentemente, esvaziavam a figura do autor.

 

Conheça um pouco sobre as primeiras correntes formalistas da crítica literária, na primeira metade do século XX, que propuseram a análise imanente da obra literária, ou seja, a análise crítica literária apenas dos elementos internos do texto. Os principais grupos foram:

 

Formalismo Russo

Formado por pesquisadores de Linguística e surgido na década de 10 do século XX, na Rússia. Objetivaram a criação de uma Ciência da Literatura. Não se interessavam pela Literatura, mas pela literariedade, a característica inerente ao texto literário. O elemento definidor da literariedade era o modo como a linguagem era empregada em um texto, e quando possuía essa característica, era designado como possuidor de uma linguagem radicalmente diferente da fala comum: a linguagem poética.

 

O New Criticism (Nova Crítica)

Corrente americana surgida durante as décadas de 20 e 30. Exigia uma postura profissional do crítico, a partir do banimento da crítica biográfica e impressionista. Orientava para a análise particularizada, minuciosa e imanente da obra literária, através da close reading (leitura microscópica). Postulou a independência do trabalho do crítico literário através da “falácia intencional”, orientação metodológica que afirmava a legitimidade da leitura da obra, independente do desejo ou da orientação impressa pelo autor em relação aos seus sentidos.

 

Na segunda metade do século XX, o Estruturalismo e o Pós- Estruturalismo reafirmaram a falta de importância da figura autoral.

 

Saiba um pouco mais sobre o Estruturalismo e o Pós-Estruturalismo: o Estruturalismo foi um movimento surgido na Europa entre as décadas de cinquenta e sessenta do século XX, a partir da abordagem proposta por Ferdinand de Saussure, de uma linguística estrutural.

 

No campo dos estudos literários, o Estruturalismo toma a obra como uma estrutura e interessa-se pela análise das relações de seus elementos internos e dos consequentes modos de produção de sentidos advindos de tais relações.

 

O Pós-Estruturalismo questionou a abordagem estável do Estruturalismo, a partir da problematização do conceito de linguagem, vista pelos pós-estruturalistas como oblíqua e instável. Trabalharam sobre a desconstrução de discursos e conceitos considerados como centrais, questionando noções como a subjetividade, a família, o Estado, Deus, a vida, a morte, o feminino e o masculino.

 

O crítico Roland Barthes defendeu em seu artigo “A morte do autor”, do livro O rumor da língua, o desaparecimento do autor, frente à autonomia do texto compreendido como potência significativa, para além do desejo autoral.

 

Para o autor, a escritura seria a destruição de toda voz e origem. Ao fim do processo de escritura, toda marca de pertencimento é rasurada e o apagamento do autor abre caminho para o nascimento do leitor.

 

Nesse sentido, o leitor assume a tarefa de cocriador, ao imprimir e organizar novos significados ao texto literário, com o afastamento do autor, pois:

 

“O nascimento do leitor tem de pagar-se com a morte do autor”.

 

O trecho a seguir, retirado do texto já citado de Jonathan Culler, resume os principais pontos a considerar sobre o conceito de teoria.

 

Quer conhecê-los?

 

“A teoria é indisciplinar- um discurso com efeitos fora de uma disciplina original. A teoria é analítica e especulativa- uma tentativa de entender o que está envolvido naquilo que chamemos de sexo ou linguagem escrita ou sentido ou ainda sujeito. A teoria é uma crítica do senso comum, de conceito considerados como naturais. A teoria é reflexiva, é reflexão sobre reflexão, investigação das categorias que utilizamos ao fazer sentido das coisas na literatura e em outras práticas discursivas.” Jonathan Culler

 

O estudo da Teoria da Literatura é muito importante e como você já aprendeu algumas coisas, vamos fazer algumas reflexões!

 

A Teoria da Literatura

Após as nossas reflexões, podemos inferir que a Teoria da Literatura é reflexiva, sistemática, interdisciplinar, analítica e questionadora do senso comum. Além desses elementos, volta-se para um objeto específico: o fenômeno literário.

 

Cabe ressaltar o fato do caráter interdisciplinar da Teoria da Literatura não significar a sua dependência de outras áreas. Se há a possibilidade dos estudos de Teoria da Literatura abrangerem o diálogo com campos disciplinares como a Linguística, a Filosofia, a Psicanálise e a Antropologia, dentre outros, a sua autonomia permanece, mesmo porque o diálogo não pressupõe a dependência, mas a conservação da diferença.

 

Ao estudar o objeto literário e os seus desdobramentos, os estudos em Teoria da Literatura investigam as ideias sobre os fatos essenciais do fenômeno literário, formulam teorias sobre os seus fatos e as sistematizam.

 

Os primeiros questionamentos sobre os fatos literários datam dos séculos V e VI a. C., na Grécia Antiga. Platão já escreveu sobre a poesia, em A República e, depois, Aristóteles redigiu as suas obras Arte Retórica e Arte Poética, nas quais sistematizou suas reflexões sobre o objeto literário. Posteriormente, com base nas reflexões aristotélicas, Horácio também criou a sua obra Arte Poética.

 

Vamos conhecer um pouco mais sobre a Teoria da Literatura. Clique nas imagens e saiba mais!

 

A perspectiva clássica e o respeito às convenções poéticas da Antiguidade, de modo geral, permaneceram até o século XIX, com a refutação dos ideais universais clássicos em prol da reivindicação da liberdade subjetiva e das especificidades nacionais. Um momento inovador surgiu a partir do século XX nos estudos teóricos de literatura, sob a perspectiva da tessitura de um repertório conceitual e reflexivo específico para o objeto literário e da autonomia e sistematização de uma ciência da literatura. Sobre a fundamentação de uma teoria da literatura, Vítor Manuel de Aguiar estabelece uma reflexão interessante, que leremos agora:

 

“Acreditamos, pois, que é possível fundamentar uma teoria da literatura, uma poética ou ciência geral da literatura que estude as estruturas genéricas da obra literária, as categorias estético-literárias que condicionam a obra e permitem a sua compreensão, que estabeleça um conjunto de métodos suscetível de assegurar a análise rigorosa do fenômeno literário. Negar a possibilidade de instaurar este saber no mundo profuso e desbordante da literatura equivale a transformar os estudos literários em desconexos esforços que jamais podem adquirir o caráter de conhecimento sistematizado.

 

Desta forma, a teoria da literatura, sem deixar de constituir um saber válido em si mesmo, torna-se uma disciplina propedêutica largamente frutuosa para os diversos estudos particulares e estes estudos de história e crítica literária – hão de contribuir cada vez mais para corrigir e fecundar os princípios e as conclusões da Teoria da Literatura. Parece-nos, com efeito, que a teoria da literatura, para alcançar resultados válidos, não pode transformar-se em disciplina de especulação apriorística, mas tem de recorrer contínua e demoradamente às obras literárias em si: exige um conhecimento exato, vivífico do fenômeno literário.”

SILVA, Vítor Manuel de Aguiar e. Teoria da Literatura. Coimbra: Almeidina, 1967.

 

A Teoria da Literatura pode ser percebida, portanto, como a organização de reflexões, conceitos e metodologias acerca da natureza do literário, empregada na interpretação, nos questionamentos e nas análises de seus objetos.

 

A Teoria da Literatura e os demais campos dos estudos literários

 

A teoria da literatura, ao eleger como seu objeto principal a reflexão sobre o fato literário, dialoga com as duas outras áreas dos estudos literários.

 

As três áreas dos estudos literários, a Teoria da Literatura, a Crítica Literária e a História da Literatura são interdependentes, porém, possuem características específicas.

 

Como visto, a Teoria da Literatura reflete sobre a natureza do literário. Não se preocupa, de um modo profundo e específico, com o significado de uma obra determinada, mas com os pressupostos que podem levar a questionamentos sobre o fato literário, sobre a compreensão da Literatura.

 

*A Crítica Literária tem como objeto a análise específica da obra literária. Com o arcabouço reflexivo permitido pela Teoria da Literatura, constrói-se a atividade crítica cujas modulações analíticas ocorrem de forma plural. Não há verdades em Crítica Literária, mas visões válidas, apoiadas em elementos teóricos consistentes e desenvolvidas com coerência.

 

Com base nos estudos teóricos e críticos são desenvolvidos os estudos de história literária cujo interesse reside no estudo dos fenômenos literários de uma dada sociedade e/ou época, em uma perspectiva diacrônica e analisando as transformações ocorridas ao logo dos tempos e os possíveis diálogos entre texto e contexto.

 

O ato de interpretação, muitas vezes, integra os três campos de estudo. Podemos mesmo afirmar que não há possibilidade de uma crítica literária séria sem embasamento teórico, assim como para analisar o fato literário, é necessário ao teórico da área de Literatura ler o trabalho do crítico.