UMA DISCRIMINAÇÃO QUESTIONADA.
Ana Luísa Escorel e Marina Colasanti ganharam prêmios literários em 2014. Aos apressados, pode parecer que as mulheres estão dominando a cena. Mas não é bem assim. Logo que se anunciou o resultado, Ana Luísa lembrou em seu discurso que, desde a sua criação, em 2008, esta foi a primeira edição a premiar uma autora feminina na categoria principal.
O padrão é seguido por outras premiações: entre todos os vencedores do Portugal Telecom, há somente três mulheres, e nenhuma delas levou o prêmio principal. O fato trouxe à tona um tema ainda pouco discutido. Menos publicadas, divulgadas e premiadas, as mulheres sofreriam preconceito no mundo editorial?
“Trabalho com a questão feminina há mais de 20 anos e posso dizer que a situação melhorou bastante”, avalia Marina. “No passado, o reconhecimento e a presença feminina eram raríssimos. Houve progressos por uma questão de mercado, já que mulheres leem mais, mas também por causa do avanço do feminismo e do número de mulheres na pós-graduação.”
Logo após, foi a vez de uma antologia de resenhas sobre escritores, “Por que Ler os Contemporâneos? – Autores que Escrevem o Século 21” (Editora Dublinense), causar polêmica nas redes sociais. Entre os 101 nomes resenhados, apenas 14 eram mulheres (nenhuma brasileira). Um dos editores da antologia, o escritor Rodrigo Rosp diz que a publicação foi montada sem qualquer preocupação que não fosse a literatura em si.
“Não nos preocupamos se havia excesso ou escassez de homens, mulheres, homossexuais, judeus, índios, negros, americanos, orientais etc”, defende-se Rosp, lembrando que há nada menos do que 42 resenhistas mulheres na antologia. “Em muitos casos, a escolha de um autor homem partiu das próprias resenhistas. Sabíamos que antologias sempre provocam críticas. Para mim, o que houve foi apenas queixa de algumas pessoas que não ficaram satisfeitas com o nosso livro. Vale lembrar que, entre os autores brasileiros selecionados também não há nenhum negro. E isso não está sendo questionado.”
Mulheres formam a maior parte do leitorado, mas, paradoxalmente, no Brasil, as autoras enfrentam maiores desafios para a publicação, acredita a agente literária Luciana Vilas-Boas. Para a ex-diretora editorial da Record, os obstáculos para as mulheres já começam nas editoras. Segundo a agente, a mulher é, no Brasil, ainda mais discriminada literariamente do que o negro.
“Até porque temas como a violência urbana e a favela, que passam pela raça, são considerados palpitantes. É verdade que, em um segmento muito comercial, de rigoroso entretenimento, como a chamada literatura ‘de mulherzinha’, ou ‘chick-lit’, ou ‘novo adulto’, predominam as escritoras voltadas para um público essencialmente feminino. E é o segmento que mais cresce no Brasil”, afirma. (AG)
Fonte: Jornal O Sul-Caderno Reportagem-11/01/2015