A SEDUTORA AGENTE DUPLA
As surpresas de Mathilde Carré, mais conhecida como A Gata, uma encantadora espiã durante a Segunda Guerra Mundial.
A literatura está lotada de mulheres espiãs. São meio manequins, vestidas na última moda, lábios e unhas vermelhas, símbolos de glamour e sofisticação, que costumam esconder o punhal na liga de uma das coxas e aptas para explodir uma estação de metrô, do tipo Tatiana Romanova, agente da KGB, num filme de James Bond.
A escritora americana Ally Carter criou um outro perfil. Cammie Morgam é uma colegial de boa família, inteligente, aplicada nos estudos, impoluta, inofensiva, carinha de anjo. Não pega em armas. Não encharca a cara com destilados de Carré, no começo, tinha um pouco do perfil de Cammie Morgan: voluntariosa e inocente. Prestou grandes serviços à França trabalhando como enfermeira. Foi um exemplo de abnegação e sacrifício nos cuidados dos soldados feridos. Foi nesse tempo que ela se entusiasmou com o projeto de uma rede de espionagem para combater os alemães. Surgiu assim o grupo de Resistência, a maioria amadores, mas liderados pelo tenente-coronel Marcel Achard. A rede conseguiu bons resultados e passaram a receber material vindo da Inglaterra lançado por paraquedas.
Mathilde tornou-se o elo. Sua especialidade era obter informações dos oficiais alemães. Usou um método bem simples. Sentava-se nos cafés de Paris e esperava que algum deles iniciasse uma conversa. Pelo seu ar insuspeito conseguiu obter informações proveitosas, abastecendo as centrais de inteligência britânicas.
Intrigados, os alemães passaram a seguir alguns suspeitos, descobrindo uma intensa ramificação com a inofensiva enfermeira Mathilde Carré. Foi capturada e levada para uma prisão militar. A surpresa, quando entrou em sua cela, um sargento alemão fino e educado, falando um bom francês, a esperava. Não a interrogou, comentou sobre a beleza de Paris, das obras de arte na França. Não foi uma conversa militar, mas cultural. Sugeriu-lhe um lugar melhor que a cela. Levou-a a uma mansão onde funcionava a contra-espionagem. A partir daquela noite passou ao lado germânico. Libertada, em seguida, continuou a trabalhar de forma confiável para os franceses, mas com resultados devassos para seus patriotas.
Depois de muito tempo, Mathilde teve que se confrontar com a realidade. Os ingleses e franceses descobriram que a atraente jovem era uma agente dupla. Terminada a guerra, foi julgada em 1949, por alta traição. A mulher de cabelo castanho, olhar profundo e sereno, foi condenada à morte. A partir daí a história passa a surpreender. Ela apelou ao presidente da República, Vicent Auriol, que assinou o documento de clemência. A pena passou a prisão perpétua. E, para surpresa de todos, em 1954 ela foi libertada, por uma decisão referendada pelo novo presidente René Coty.
Mathilde carré, A Gata, apesar de sua traição, deixou à posteridade o enigma de receber o tratamento de uma dama e a indulgência dos homens mais poderosos.
Uma história com final feliz para uma agente dupla.
Fonte: Jornal ZeroHora/Revista Donna de 19/7/2015 Por Themis Pereira de Souza Vianna