A BRUXA ESTÁ SOLTA
O terror nunca deixou de levar público ao cinema – ainda que nem sempre tenha gozado de prestígio artístico. Em constante renovação, o gênero tem emplacado nos últimos anos alguns títulos em prestigiados festivais internacionais – caso do sueco DEIXA ELA ENTRAR (2008) e o americano CORRENTE DO MAL (2014). O mais recente sucesso de crítica do estilo é A BRUXA (2015), sensação da última Mostra de São Paulo e prêmio de melhor direção no Festival de Sundance para Robert Eggers, estreante em longa-metragem. Produzido pelo brasileiro Rodrigo Teixeira, o filme americano em cartaz na Capital é mesmo impressionante, apostando no equilíbrio entre as aterrorizantes imagens sobrenaturais e um clima permanente de instabilidade emocional e psicológica dos protagonistas.
A trama de A BRUXA se passa em 1630, na Nova Inglaterra, onde uma família de puritanos vive isolada nas franjas de uma floresta, depois de ter sido expulsa da colônia por conta do rigor religioso de seu patriarca, William (Ralph Ineson). Depois que o bebê do clã é roubado por uma bruxa, o medo e o fervor religioso começam a dividir a família: a mãe, Katherine (Kate Dickie), desconfia que a filha mais velha, Thomasin (Anya Taylor-Joy), que estava cuidando da criança quando ela sumiu, seja uma feiticeira – ao mesmo tempo em que o casal de gêmeos pequenos, sempre às voltas com um bode preto, reforça a acusação à irmã.
Produção baratíssima – custou apenas US$ 3,5 milhões –, A BRUXA é eficaz em recriar a austera vida dos colonos ingleses nos Estados Unidos de princípios do século 17, em que a cenografia e o figurino encontram eco na fotografia de Jarin Blaschke, calcada na luz natural e de velas, e na música solene de acento sacro de Mark Korven. Baseado em relatos registrados por jornais e documentos de tribunais da época, A BRUXA perturba por não se restringir a uma abordagem unívoca, mostrando que o horror habita tanto o lado de fora, na floresta, quanto o interior da mente dos personagens. Em A BRUXA, o mal é delírio e realidade: o enredo dá a mesma atenção para a histeria coletiva e o fanatismo de episódios históricos célebres como os das chamadas bruxas de Salem (também na Nova Inglaterra, em 1692) e o das freiras possessas de Loudun (na França, em 1634) e para o imaginário ligado à iconografia demoníaca, criando cenas que lembram as representações de bruxarias das gravuras e das pinturas negras de Goya.
Trailer: https://www.youtube.com/watch?v=FE-u6RznkGQ
Fonte: ZeroHora/Roger Lerina (roger.lerina@zerohora.com.br) em 11 de março de 2016.