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INCOMUNICABILIDADE ESTÁ NO CERNE DE DRAMA LITUANO
Exibido da seção Quinzena dos Realizadores no Festival de Cannes do ano passado, PAZ PARA NÓS EM NOSSOS SONHOS (2015) apresenta ao circuito comercial brasileiro a obra de um dos mais respeitados diretores europeu da atualidade: o lituano Sharunas Bartas. Primeira produção do cineasta, roteirista e ator distribuída no país, o longa em cartaz na Capital é o mais recente exemplar do tipo de cinema praticado pelo autor de títulos como TRÊS DIAS (1991), O CORREDOR (1995) e A CASA (1997): narrativas concentradas na incomunicabilidade, em que as palavras e os gestos dos atores são contidos – a fim de extrair das interpretações uma espécie de humanismo seco como o dos filmes do mestre francês Robert Bresson (1901 – 1999).
A história de PAZ PARA NÓS EM NOSSOS SONHOS é ambientada em uma casa de campo e suas cercanias, onde um homem vai passar um final de semana no verão com a atual companheira e a filha adolescente. Após a morte da mãe, a garota passou a morar só com o pai, que atualmente se relaciona com uma jovem violinista. Apesar do amor que sentem entre si, o relacion amento entre eles é instável e distante: cansado de sua rotina de trabalho, ele não parece perceber as ansiedades da mulher, insegura quanto à carreira musical e as escolhas sentimentais, e a confusão emocional da filha, dividida entre a saudade materna e as dúvidas típicas da idade. Um casal vizinho de camponeses e seu ilho também adolescente servem como contraponto à família burguesa, mostrando que a falta de diálogo, a insatisfação existencial e a solidão não são privilégios de classe.
Em PAZ PARA NÓS..., os personagens não têm nome e são interpretados em geral por atores não profissionais – a namorada do protagonista, por exemplo, é encarnada por Lora Kmieliauskaite, uma violinista profissional. Já os papéis de pai e filha replicam na ficção a vida real: Sharunas Bartas contracena com Ina Marija Bartaité, fruto de seu casamento com a russa Katia Golubeva – atriz principal dos primeiros filmes do realizador morta em 2011, que aparece em vídeos antigos encontrados pelo homem.
Fonte: ZeroHora/Segundo Caderno/Roger Lerina (roger.lerina@zerohora.com.br) em 3 de junho de 2016