SPIELBERG E OS GIGANTES
DIRETOR VOLTA A CONTAR UMA HISTÓRIA INFANTIL EM “O BOM GIGANTE AMIGO”, BASEADO EM LIVRO DO ESCRITOR ROALD DAHL
Steven Spielberg ficou conhecido, entre outras qualidades, pela maestria em narrar no cinema os sonhos e as angústias da infância, apresentadas com encanto e pungência. O diretor de clássico como E. T. – O EXTRATERRESTRE (1982) e HOOK: A VOLTA DO CAPITÃO GANCHO (1991) fala de novo com os pequenos em O BOM GIGANTE AMIGO (2016) – desta vez, apoiando-se nos ombros de outro grande contador de histórias para crianças: o escritor Roald Dahl (1916 – 1990), galês autor de vários livros infantis já levados ao cinema, como A FANTÁSTICA FÁBRICA DE CHOCOLATE, MATILDA, JAMES E O PÊSSEGO GIGANTE e O FANTÁSTICO SR. RAPOSO.
Quem encarna com a ajuda de efeitos especiais de primeira qualidade o BGA – como é carinhosamente chamado o enorme protagonista – é o excelente ator inglês Mark Rylance, oscarizado por seu papel em PONTE DO ESPIÕES (2015), produção anterior de Spielberg. O filme está em cartaz na Capital em cópias 3d e convencionais, em versões dublada e legendada.
Em O BOM GGANTE AMIGO, a menina Sofia (a encantadora inglesinha Ruby Barnhill, atriz estreante no cinema) vive em um orfanato londrino. Insone, a solitária garota vara as madrugadas lendo e espiando a noite lá fora, dividida entre o fascínio e o medo de seres fantásticos. Em uma dessas vigílias, a pequena xereta é flagrada por uma enorme criatura que circula pelas sombras. O homem colossal acaba raptando Sofia e a levando para sua casa.
FILME FOI ESCRITO PELA MESMA ROTEIRISTA DE “E. T.”
Chegando à Terra dos Gigantes, a jovem mocinha acredita que seu destino é virar comida de monstro – logo, porém, Sofia percebe que seu captor é na verdade um grandalhão orelhudo e dócil, que se enrola todo falando com palavras erradas e neologismos engraçados. Acompanhado da nova companheira, o BGA retoma seus afazeres diários: caçar sonhos como quem apanha borboletas, a fim de espalhá-los entre os humanos no sono.
A inusitada dupla, porém, terá que se cuidar: os gigantes que vivem na vizinhança são brutos e têm pelos menos duas vezes o tamanho do amigão de Sofia – além de adorarem carne de criança. Enquanto os malvados vilões farejam a presença de um humano no refúgio de BGA, Sofia arma um plano para se livrar deles – que inclui a intervenção de ninguém menos do que a rainha da Inglaterra (Penelope Wilton).
Os incríveis efeitos de captação de imagem reproduzem em escala hiperbólica as expressões faciais e a atuação de Mark Rylance – ator shakespeariano que, além de brilhar no teatro e no cinema, também se destacou na pele Thomas Cromwell na série televisiva WOLF HALL. Apesar da diferença de tamanhos, a interação entre o bom gigante e a esperta órfã funciona muito bem na tela. Já a narrativa não tem a mesma fluência: excessivamente longo – o filme tem quase duas horas de duração –, O BOM GIGANTE AMIGO desenvolve sua trama com um ritmo irregular, arrastando-se mesmo em alguns trechos. Spielberg e a roteirista Melissa Mathison – a mesma de O CORCEL NEGRO (1979) e de E. T. – enfatizam os momentos mais contemplativos e emotivos do enredo, destacando as belas imagens e os diálogos calorosos em detrimento das cenas de ação.
O resultado é uma fábula sensível, com toques nostálgicos e melancólicos, fiel ao universo de Roald Dahl. No entanto, mais próximo do reflexivo A.I.: INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL (2001) do que do empolgante conto do extraterrestre que quer voltar para casa, O BOM GIGANTE AMIGO parece feito mais para adultos saudosos da infância do que propriamente para crianças.
Fonte: Zero Hora/Roger Lerina (roger.lerina@zerohora.com.br) em 31 de julho de 2016.