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Entrevista com Catmull, Morris e Millstein
Entrevista com Catmull, Morris e Millstein

OS CHEFÕES DA ANIMAÇÃO

 

Os presidentes dos estúdios Disney e Pixar falam sobre inovação tecnológica, sobre a incerteza do sucesso – e sobre a esperteza do público infantil.

 

Da perspectiva estrita dos negócios, foi a Disney que, em 2006, comprou a Pixar, na transação de 7,4 bilhões de dólares que consolidou um gigante do cinema de animação. Do ponto de vista artístico, porém, a Disney, embora preservando algumas de suas marcas históricas, na verdade acabou absorvida pelo estúdio mais jovem. John Lasseter, fundador da Pixar, é o chefe criativo. A se lado, está o presidente dos dois estúdios, Ed Catmull, também fundador da Pixar e reconhecido desenvolvedor de novas tecnologias para animaçção. Abaixo de Catmull, trabalham Jim Morris, presidente da Pixar, e Andrew Millstein, da Disney. O trio, que capitaneia os times de animadores que já produziram filmes memoráveis como TOY STORY e FROZEN, visitou recentemente o Brasil (Millstein veio promover o próximo filme da Disney ZOOTOPIA) e conversou com VEJA sobre a indústria e a arte de animação.

 

 

A maca dos estúdios Disney e Pixar nem sempre é tão distinta: OPERAÇÃO BIG HERO, da Disney, tem todo o jeitão da Pixar, e VALENTE poderia ser um filme de princesa da Disney. O que ainda distingue um estúdio do outro? 

Jim Morris: Os exemplos que você cita são corretos, sim, mas de modo geral cada estúdio tem sua marca distinta. Não existe lei que proíbe a Pixar de fazer filmes de contos de fadas nem a Disney de fazer animações como DETONA RALPH, que tem um certo sabor da Pixar. E é verdade que algumas ideias que desenvolvemos poderiam ser do outro estúdio. Mas, de forma geral, há um DNA particular da Disney. É de lá que vêm filmes musicais ou com base em contos de fadas e de princesas. A Pixar tem uma origem diferente, com uma orientação mais tecnológica e uma ênfase em personagens que, francamente, às vezes são quase anti-Disney.

 

 

Andrew, você trabalhava na Disney antes da compra da Pixar e da chegada de John Lasseter e Ed Catmull. O que mudou?

Andrew Millstein: Já trabalhava na Disney havia uns oito anos quando se deu a aquisição da Pixar, e muita gente que ainda hoje trabalha no estúdio também já estava lá antes. O que mudou não foi o pessoal, mas o ambiente em que trabalhamos. Mais do que tudo, tem a ver com uma autonomia para as lideranças criativas, para os animadores, não havia equilíbrio entre o que o pessoal administrativo e do financeiro planejava e o que o pessoal criativo desejava para os filmes.

 

 

Quanto a tecnologia da animação digital ainda pode avançar? 

Ed Catmull: Quando Walt Disney começou, o desenho animado era high-tech. Na cor, no som, ele estava usando o que havia de mais novo, o que estava sendo inventado. Depois que ele morreu, pararam de fazer isso. A inovação tecnológica, porém, traz no a energia para os artistas, como se viu na revolução do computador. Hoje, o pessoal técnico e os artistas trabalham lado a lado. O artista pressiona a equipe técnica para desenvolver novas ferramentas. O pessoal técnico, por sua vez, tenta responder às exigências do artista porque quer ver suas inovações na tela. É um círculo virtuoso, em que um inspira o outro. E a tecnologia continua avançando. Nada é estável nesse processo, e queremos que continue assim.

 

 

Quanto a concorrência de outros estúdios importa para o trabalho de vocês? 

Millstein: Nós assistimos aos filmes de outros estúdios, acompanhamos com curiosidade a tecnologia que eles usam, e observamos como o público reage a eles. Quanto melhor esses filmes se saírem globalmente, melhor será para a animação. Queremos uma indústria vigorosa, pois há um óbvio intercâmbio de ideias. Quanto mais diversa e vibrante for a indústria, melhor será para todos.

Catmull: Além disso, de um ponto de vista prático, nós não competimos só com outras animações. Há vários outros filmes que disputam a mesma fatia de mercado.

 

 

Como vocês equilibram, nos filmes de animação, os elementos que são destinados às crianças e aqueles que pretendem seduzir também os pais delas? 

Morris: Como a maioria dos nossos diretores tem idade emocional que não ultrapassa os 10 anos, acho que não há muita diferença…

Catmull: Isso é verdade! Mas é preciso entender um princípio importante. As pessoas acham que fazemos filmes para crianças. Não, não fazemos isso. As crianças vivem em um mundo de adultos, antenadas para tentar entender esse mundo. Então, se fizermos um filme apenas para crianças, vamos subestimá-las. Só funciona se fizermos um filme que nós mesmos gostaríamos de ver. 

Millstein: As crianças nos surpreendem o tempo todo. Alguns temas ou enredos podem parecer complicados, mas elas entendem.

 

 

O BOM DINOSSAURO, da Pixar, fez 120 milhões de dólares de bilheteria americana e 310 milhões no mundo todo, números considerados baixos. O que houve?

Morris: Tenho orgulho de O BOM DINOSSAURO, e estou decepcionado por ele não ter feito uma bilheteria maior. É um filme sobre sobrevivência, uma história sobre amadurecimento, temas difíceis. Estamos tentando entender o que levou a isso. 

Catmull: Ele saiu bem no Brasil. Veja, na nossa história, sempre corremos alguns riscos. RATATOUILLE é um filme sobre o amor à arte, e UP é basicamente sobre um homem de idade que está tentando superar o luto. Sempre procuramos passar a emoção, e esperamos que ela encontre ressonância no público. Com O BOM DINOSSAURO, ocorreu o mesmo. É um filme emotivo, que não tinha tantas piadas. O fato é: faríamos hoje as mesmas escolhas. Se não corrermos riscos, estaremos artisticamente falidos. Vale observar, aliás, que, quando lançamos FROZEN, existiam dois elementos no filme que eram considerados problemáticos: havia não uma, mas duas princesas, e era um musical. E o filme se tornou esse êxito gigantesco.

 

 

A Pixar tem sequências de filmes de sucesso – TOY STORY, PROCURANDO NEMO – programadas para os próximos anos. Qual a política do estúdio para as continuações?

Catmull: Nossa regra é: nós nos guiamos pela paixão dos diretores. Eles amam o universo que criaram nos filmes, e às vezes desejam voltar a esse universo. Mas não é uma resposta imediata. Outros estúdios fazem sequências dois ou três anos depois do primeiro filme. Nós não. PROCURANDO DORY, a continuação de PROCURANDO NEMO, vai estrear treze anos depois do filme original.

 

Fonte: Revista VEJA/Jerônimo Teixeira em 02/03/2016.